Química - Ideia 04

Por Alexandre Lima

Previsão qualitativa da estabilidade nuclear

A Ideia Noic desta semana introduz ao leitor uma visão alternativa que permite justificar uma grande variedade de fenômenos químicos. O objetivo é sintetizar fatos conhecidos sobre a Estabilidade Nuclear para que o aluno olímpico seja capaz de reconhecer consequências desses fatos em diversas áreas da Química.
Começaremos com os seguinte exercícios-base:

"O Boro ocorre naturalmente na forma dos isótopos B^{10} e B^{11}. Este último corresponde a 80% do Boro de ocorrência natural.
O que justifica o fato de o Boro 11 ser mais abundante do que o Boro 10?"

"As séries radioativas (ver Curso Noic) do Urânio, do Actínio e do Tório têm seu fim em isótopos de Chumbo - isto é, esses elementos sofrem decaimentos radioativos sucessivos até serem convertidos em isótopos de Chumbo, estáveis.
Por que as três séries radioativas citadas convergem para o Chumbo?"

A aula 1 do Curso de Radioatividade aborda o conceito de Estabilidade Nuclear, que é muito útil para responder aos dois exercícios: a estabilidade do núcleo atômico é um excelente argumento para se julgar a abundância de um elemento químico. A ideia geral dessa aula, porém, não é apropriada para justificar a ordem de estabilidade dos isótopos de Boro, pois - tomando o conteúdo da aula 1 como referência - o pequeno número atômico do Boro tornaria a razão \dfrac{n}{p} = 1 ideal para um átomo de Boro, o que sugeriria que o isótopo mais abundante de Boro é B^{10}.
Conclui-se, portanto, que é necessário um conceito adicional para se prever quão estável será um nuclídeo.

Fonte: Wikipedia

Assim como os elétrons, os prótons e nêutrons presentes no núcleo atômico são dispostos em diversos níveis de energia. Uma evidência disso é a emissão de radiação gama, a qual gera um nuclídeo isômero de energia mais baixa: esse fenômeno consiste em um salto quântico no núcleo, análogo ao que ocorre com elétrons na eletrosfera.

Duas consequências da distribuição de nêutrons e prótons em camadas energéticas são princípios que nos serão úteis para julgar a estabilidade nuclear - e, como corolário, a abundância de isótopos.

  • Um nuclídeo será mais estável se contiver uma número par de prótons e/ou nêutrons; o fato de que elementos de número atômico par são, de um modo geral, mais abundantes do que os demais é conhecido como Regra de Oddo-Harkins. Assim como elétrons desemparelhados são particularmente suscetíveis a certas reações químicas, a ideia é que prótons e nêutrons desemparelhados contribuam para uma maior reatividade frente a decaimentos radioativos.
  • Nuclídeos com um número mágico de prótons e/ou nêutrons tendem a ser extraordinariamente mais estáveis do que os demais - sendo os "números mágicos" 2, 8, 20, 28, 50, 82 e 126. Essa tendência é análoga à tendência dos gases nobres a serem quimicamente inertes: se átomos com o subnível p totalmente preenchidos dificilmente sofrem transformações em sua eletrosfera, átomos com alguns subníveis do núcleo totalmente preenchidos têm dificuldade em sofrer decaimentos radioativos.

Destarte, sua bagagem de Radioatividade já é suficiente para responder aos dois exercícios que introduziram esta Ideia Noic:

  1. Boro (Z=5) tem número atômico ímpar, o que já contribui para que ele seja um elemento raro. Entre os isótopos de ocorrência natural, B^{11} tem o diferencial de conter um número par de nêutrons no núcleo, o que o torna mais estável do que B^{10} - perceba que a regra de Oddo-Harkins é mais relevante para a estabilidade nuclear do que a razão \dfrac{n}{p} próxima de 1.
  2. O maior dos números mágicos é 126 e o segundo maior é 82. Como só conhecemos 118 elementos até o momento, o maior número atômico conhecido que coincide com um número mágico é Z=82, do Chumbo. Por isso as séries do Urânio, do Actínio e do Tório só alcançam estabilidade nuclear apreciável ao gerar o Urânio - veja que, no caso do Pb_{82}^{208}, tanto o número atômico quanto o número de nêutrons são números mágicos.
Fonte: IUPAC

A equipe NOIC agradece seu interesse e se considera honrada em proporcionar este conteúdo ao leitor.
Para a leitura de detalhes mais profundos sobre estabilidade nuclear, recomenda-se a leitura de Química Inorgânica não Tão Concisa, de John D.Lee. Um resumo semelhante a este - e mais do que suficiente para as olimpíadas de Química! - pode ser encontrado em Química, a Ciência Central, de Theodore Brown, Eugene LeMay e Bruce Bursten.

Experimente exercitar esta Ideia Noic com os problemas Iniciante e Intermediário da Semana 60.