Física - Ideia 06

Escrita por Victor Ivo:

A força resultante numa corda pode ser um objeto de estudo útil em diversas situações, e a aplicação disso e de suas generalizações é diversa. Vamos dividir o estudo de cordas em dois casos, o caso de cordas sem massa e com massa.

Cordas sem massa:

Em mecânica clássica, para um sistema ter quantidade de movimento ele precisa ter massa, e devido a isso qualquer pedaço de uma corda sem massa tem quantidade de movimento zero. A força resultante sobre um sistema é igual à taxa de variação de quantidade de movimento dele, portanto um sistem sem massa deve estar sobre ação de força resultante nula.Equilíbrio

Figura 01: Sistema sob ação de diversas forças.

E i sendo um índice que representa a i-ésima força sobre o sistema, a condição de equilíbrio translacional do sistema é:

\sum \vec{F}_{i}=\vec{0}

Desta maneira, uma corda sem massa se ajusta de tal modo que a força resultante sobre um pedaço qualquer de corda é zero. Se as forças nela forem apenas de tração e uma força F é aplicada na ponta dessa corda, então delimitado um pedaço da corda de certo tamanho, uma força aplicada na outra extremidade desse pedaço deve ser igual em módulo e direção à força que você aplica na corda. Portanto o formato da corda deve ser uma reta e ela deve ter uma tração constante.

Cordas

Figura 02: a) Corda sob ação de trações não paralelas e diferentes em cada extremidade. b) Corda em equilíbrio, pela igualdade em módulo e direção das trações.

Com a aparição de forças externas na corda, ela pode obter outros formatos, sempre o necessário para que ela esteja sob ação de força nula. No caso de uma corda encostada numa superfície, por exemplo, a corda em geral não tem formato de reta, pois existe uma força externa, em geral normal, causada pela superfície. Considere o exemplo de uma corda presa numa polia e puxada com uma força F em suas duas pontas:

Polia Forças

Figura 03: Polia tendo suas cordas puxadas pelas duas extremidades

Devido ao contato com a superfície a corda consegue ter o formato curvo, e você pode inclusive calcular quanto é a normal que a superfície faz num certo ponto da corda:

Corda Superfície

Figura 04: Corda curvando devido a normal externa.

Como o ponto selecionado é muito pequeno você pode considerar ele como praticamente plano, com as duas trações levemente rotacionadas devido à curvatura da superfície. Com essa aproximação a força de normal é aproximadamente vertical. Tomando a condição de equilíbrio desse pedaço de corda, i.e, força resultante nula, você consegue encontrar a mudança da tração e o valor da normal:

-Equilíbrio em x:

T_{1} cos(\frac{\theta}{2})=T_{2} cos(\frac{\theta}{2})

T_{1}=T_{2}=T

Portanto, como a tração não muda dum ponto a outro, a tração é constante ao longo da corda toda!

-Equilíbrio em y:

N=(T_{1}+T_{2}) sen(\frac{\Delta \theta}{2})

E como para ângulos pequenos sen(\theta) \approx \theta, para o ponto vale:

N = 2T sen(\frac{\Delta \theta}{2}) \approx T \Delta \theta

Desta maneira a normal pra um dada abertura é a mesma para qualquer ponto analisado da superfície de contato da corda. Portanto, para existir uma curvatura de uma corda tracionada deve existir força externa sobre ela, mesmo que ela não tenha massa.

Cordas com massa:

Uma corda com massa pode estar sob ação de força resultante, o que muda algumas propriedades, pois ela pode, por exemplo, estar sob aceleração. Ademais, em sistemas com gravidade o peso de cada pedaço de corda passa a ser relevante. Imagine, por exemplo, uma corda, passando uma polia, segurando dois corpos de massa m em seus extremos.

Polia Simétrica

Figura 05: Polia segurando duas massas iguais por cordas massivas

Por simetria o sistema está claramente em equilíbrio, então fazendo a condição de equilíbrio numa secção da corda de tamanho L:

T_{2}-T_{1}=\Delta m g= \lambda g L

T(y)=T(0)+\lambda g y

Portanto, a tração cresce linearmente com a altura, pois ela está tendo que sustentar uma coluna cada vez maior de massa ao longo que subimos pela corda. E o mais interessante desse resultado é que ele sequer depende do formato da corda. Considere uma corda homogênea numa superfície lisa, numa região com campo gravitacional g. Se ela está em equilíbrio vale que num pedaço de corda, fazendo a condição de equilíbrio na direção da superfície e na direção perpendicular à superfície, com a devida decomposição do peso:

-Equilíbrio normal:

N=T d\theta+dm g cos(\theta)

-Equilíbrio paralelo:

dT=dm g sen(\theta)

Contudo, com a corda tendo uma densidade linear de massa constante, vale:

dm=\lambda d(l)

E das relações trigonométricas desse trecho da superfície:

dy=d(l)*sen(\theta)

dx=d(l)*cos(\theta)

Portanto:

dT=\lambda g * d(l) * sen(\theta)=\lambda g dy

T(y)=T(0)+\lambda gy

Como tinhamos vistos no caso particular de uma corda vertical. Portanto, a tração cresce linearmente com a altura devido à gravidade, independente do formato da corda, uma analogia com o crescimento da pressão num líquido com a profundidade dele. E a normal vale:

N=T d\theta+\lambda g dx

Que é ligeiramente maior que o caso de corda sem massa, devido à contribuição do peso. A ideia mais importante de se pegar desse texto é que forças perpendiculares à corda curvam ela e forças paralelas à corda mudam sua tração.

Exemplos:

1 - Corda sem massa num sistema de polias:

Um sistema com várias polias no qual as conexões são feitas por cordas deve ter a tração constante ao longo da corda inteira. Essa propriedade segue do que foi provado sobre o fato da tração ser constante e a corda ter formato de reta quando ela não tem massa e está livre de forças externas. Contudo, a corda pode curvar em contato com a polia, devido à força normal da superfície e isso faz o sistema ter a forma desejada. No caso de uma polia fixa com duas massas diferentes presas com cordas, você pode usar a ideia de tração constante numa corda sem massa para encontrar a aceleração das massas:

Máquina Attwood

Figura 06: Polia com duas massas ligadas

Aplicando a segunda lei de Newton nas duas massas você encontra:

T-m_{1}g=m_{1} a_{1}

T-m_{2}g=m_{2} a_{2}

E como a corda tem comprimento constante, o tamanho dela pendurado na direita mais o da esquerda é igual a uma constante, e como a velocidade das massas serão a taxa temporal de variação desses tamanhos:

v_{1}=-v_{2}

Pois a corda que sai de um lado tem que ir para o outro. Daí, vale também, sendo a aceleração a taxa de variação temporal da velocidade:

a_{1}=-a_{2}

Portanto, simplificando as equações de força para:

\frac{T}{m_{1}}-g=a_{1}=-a_{2}

E, daí:

T=\frac{2m_{1}m_{2}}{m_{1}+m_{2}}g

Tal que:

a_{1}=\frac{2m_{2}}{m_{1}+m_{2}}g-g=\frac{m_{2}-m_{1}}{m_{1}+m_{2}}g

2- Corda presa por dois apoios:

Uma massa M de corda está presa sob dois pontos fixos de uma parede, que estão na mesma altura, tal que o ângulo que a corda faz com a vertical em qualquer um dos pontos é \theta. Você pode encontrar a tração da corda no ponto mais baixo dela só a partir dessas duas informações, sabendo que o campo gravitacional externo vale g.

Corda entre Paredes

Figura 07: Corda entre paredes

A tração no centro tem componentes apenas horizontais, pela simetria do sistema, e o termo vertical tem que sustentar a massa da corda. Portanto, pelo equilíbrio da corda:

2T_{y}=Mg

T_{y}=\frac{Mg}{2}

E a tração no ponto fixo, como em qualquer ponto da corda, deve ser paralela à mesma, portanto:

\frac{T_{y}}{T_{x}}=tg(\theta)

T_{x}=\frac{Mg}{2} cotg(\theta)

O termo horizontal da tração é constante ao longo de toda a corda, pois todos pedaços estão livres de forças externas em x, portanto a tração no ponto mais baixo da corda é só horizontal e igual à tração horizontal constante:

T=\frac{Mg}{2} cotg(\theta)

3 - Corda massiva girando:

Todos os pontos de um laço inextensível de densidade linear de massa constante e massa m estão girando com velocidade angular \omega em torno de um ponto do espaço. Você pode encontrar a tração interna desse laço e seu formato por meio do estudo da dinâmica do fio, sabendo que a tração dele é a mesma para qualquer secção da corda. A resultante de forças em qualquer ponto do laço deve ser centrípeta, pois, como o movimento dos pontos se consiste de rotações em torno de um eixo, a distância deles a esse eixo se conserva. A resultante de forças na corda deve apontar  para o eixo de rotação dela, portanto tem uma direção constante, e como a tração é constante, a resultante de forças na corda deve ser perpendicular à corda em qualquer ponto. Aplicando a segunda lei de newton num pedaço de corda de massa \Delta m:

\Delta m \omega^{2} r= T \Delta \theta

m \frac{\Delta \theta}{2\pi} \omega^{2} r=T \Delta \theta

r= \frac{2\pi T}{m\omega^{2}}

Portanto, como a tração é constante, a distância de qualquer pedaço de massa ao eixo de giro é constante, sendo o formato do anel uma circunferência centrada no seu eixo de rotação. E, sabendo que o tamanho da corda é igual a l:

r=\frac{l}{2\pi}=\frac{2\pi T}{m \omega^{2}}

T=\frac{m \omega^{2} l}{4\pi^{2}}

Problemas Relacionados:

P1- Qual a condição sob as forças externas para que uma corda parada e sem massa tenha formato reto?

P2 (200 More Puzzling Problems in Physics)- As duas pontas de uma corda de comprimento 40 cm estão fixas em pontos de mesma altura, como mostrado na figura. Ache o raio de curvatura da corda no ponto mais baixo dela e nos pontos de suspensão.

Corda Presa

Figura 08: Corda pendurada em dois apoios

P3 (200 More Puzzling Problems in Physics)- Uma corda flexível de densidade linear constante passa por duas polias sem atrito que são postas à mesma altura. O tamanho da corda entre as polias é l, e a altura entre o ponto mais baixo da corda entre as polias e as polias é h. Com base nesses dados, encontre qual o tamanho pendurado s das cordas nas duas polias.

Corda Livre Pendurada

Figura 09: Corda pendurada entre as duas polias.

P4 (200 More Puzzling Problems in Physics)- A extremidade de um colar de pérolas é pendurado à superfície externa de um cilindro fixo com raio R e eixo horizontal. O ponto P em que o colar é fixado está no mesmo nível vertical que o eixo do cilindro. O colar dá uma volta no cilindro e seu fim é deixado livre para ficar alinhado com a vertical. Qual deve ser o tamanho l do pedaço pendurado da corda para que o resto do colar toque a superfície do cilindro em todos os pontos?

Corda Perolas

Figura 10: Pérola presa num cilindro

P5 (200 More Puzzling Problems in Physics)- O eixo de uma bicicleta está posta horizontalmente e um loop de bicicleta é posto em cima da roda dentada, como mostrado na figura. A roda dentada então começa a girar em torno de seu eixo principal com taxa de aumento constante até chegar numa velocidade angular alta, mas constante. Qual o formato do corrente?

Corda Girando

Figura 11: Corrente girando numa roda dentada

P6 (200 Puzzling Problems in Physics)- Uma corrente flexível de densidade linear de massa constante está amarrada de maneira firme entre dois cilindros tal que a figura é parecida com um estádio de corrida olhado por cima, pois a forma fica como de dois semi-cilindros ligado por dois segmentos retos. Os cilindros começam a rodar de tal maneira que a corrente toda se move com velocidade v.

Corda Corrente

Figura 12: Corrente fluindo entre os cilindros

Por alguma razão, a corrente repentinamente desliza dos cilindros e começa a cair verticalmente. Qual o formato da corrente durante a queda? De acordo com Steve, ele deveria tomar inicialmente um formato circular pela força centrífuga (que um referencial girante veria). Bob aceita esse ponto, mas ele considera que a corrente "elíptica" vai ser deformada além do formato circular por esse efeito, e virar uma elipse com eixos rotacionados  90^{\circ} em relação à elipse original. Ele espera que esse processo se repita e que o formato da corda oscile entre essas duas elipses. Frank acha que o formato da corda vai continuar o mesmo, mas ele não sabe razões para mostrar seu ponto. Quem está certo, se algum está certo?