Introdução, fator de van't Hoff e molalidade

Aula de Dayanne Rolim

Introdução
Falar de propriedades coligativas é remeter ao comportamento de soluções. Estas são quaisquer propriedades que dependam somente do número de partículas de soluto dissolvidas em um determinado solvente, e nunca da natureza do solvente (polar, levemente polar, apolar, etc.)

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As quatro propriedades coligativas mais estudadas são:

• tonoscopia, que é o abaixamento da pressão máxima de vapor
• ebulioscopia, que é o aumento da temperatura de ebulição
• crioscopia, que é o abaixamento da temperatura de início de solidificação
• osmoscopia, relacionada ao fenômeno de passagem de solvente através de uma membrana semipermeável

Para estudar essas propriedades, compara-se o comportamento da solução em determinadas condições com o comportamento do solvente puro, nas mesmas condições.

Vale lembrar que, para se tratar de uma propriedade coligativa, o material dissolvido (soluto) é, necessariamente, não-volátil. Ou seja, ele é incapaz de evaporar.

Exemplos de soluções formadas com solutos não-voláteis:

- água + sacarose
- água + cloreto de sódio
- água + fosfato de potássio

Exemplos de soluções formadas com solutos voláteis (às quais não se atribuem propriedades coligativas):

- acetona + tetracloreto de carbono
- álcool etílico + água
- benzeno + octano

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Visto que as propriedades coligativas dependem somente do número de partículas de soluto em solução, é interessante aprendermos a calcular o número dessas partículas (o que pode parecer intuitivamente simples, mas apenas o fator de van’t Hoff pode fornecer o resultado desse cálculo sem erros.)

Fator de [correção de] Van’t Hoff (i)

Em soluções iônicas, a dissociação do soluto precisa ser levada em consideração para calcular o número total de partículas em solução.

Temos, a exemplo, uma solução de NaCl. Como este sal se dissocia em Na^+ e Cl^-, formando duas partículas, a intensidade do efeito coligativo deve ser propriamente multiplicado por 2, para fornecer um valor compatível com a realidade.

Sabemos que isso é verdadeiro pois o grau de dissociação \alpha  (\dfrac{numero \, de \,particulas \,dissociadas}{numero \,de \,particulas \,dissolvidas}) para o NaCl é igual a 100%.

Vale relembrar que, em compostos iônicos, aceita-se, teoricamente, que \alpha seja 100%. No entanto, em certos experimentos, pode-se encontrar o valor de \alpha menor que 100%. Este fato é explicado da seguinte maneira: a solução não se encontra suficientemente diluída para que o efeito coligativo perceba a separação de íons (cátions e ânions). Nesse caso, o \alpha é chamado de grau de dissociação aparente.

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Numa solução iônica, o número de partículas de soluto existentes em solução depende:

- do número de íons presente em cada fórmula mínima do composto
- do grau de dissociação ou ionização a desse composto a determinada temperatura*

*Sabemos, por meio do estudo de equilíbrios iônicos, que o \alpha é dependente da temperatura.

Vamos levar em conta, agora, o ácido sulfúrico (H_2SO_4). A 18°C, este ácido forte apresenta \alpha = 0,61. Sua reação de ionização é representada por:

1 H_2SO_{4(l)} + 2 H_2O_{(l)} \Rightarrow 2 H_3O^+ _{(aq)} + 1 SO_{4(aq)}^{2-}

1 mol de moléculas de ácido  \Rightarrow 3 mols de íons (se \alpha = 100%)

Como, na realidade, \alpha = 0,61, concluímos que, de cada 100 moléculas de ácido sulfúrico que entram em contato com a água, apenas 61 moléculas ionizam, enquanto 39 permanecem na sua forma molecular.

Total de partículas em solução = 39 H_2SO_{4(l)} + 122 H_3O_{(aq)}^{+} + 61 SO_{4(aq)}^{2-} = 222 mols de partículas

Por volta de 1882, o cientista holandês Jacobus Henricus van’t Hoff desenvolveu uma forma simples de calcular o número de partículas em solução, relacionando a e o número de íons presentes no composto iônico.

A fórmula para o fator de correção de van’t Hoff é

i = 1 + \alpha \cdot ( q - 1)

 

A correção necessária, neste caso, é:

i = \dfrac{Efeito \, coligativo \,observado}{Efeito \, coligativo \,calculado}

Para demonstrá-la, tomemos como exemplo a dissociação de um composto iônico A_xB_y.

A_xB_y \Rightarrow xA^{y+} + yB^{x-}

início  (n) (0) (0)
variação (-\alpha \cdot n) (+x \cdot \alpha n) (+y \cdot \alpha n)
equilíbrio (n - \alpha n) (x \cdot \alpha n) (y \cdot \alpha n)

tal que i = \frac {(n - \alpha n)+ (x \cdot \alpha n) + (y \cdot \alpha n)}{n}

\Rightarrow i = 1 + \alpha \cdot [(x+y) - 1]

Mas seja (x+y) = q = número de partículas em solução

Então, i = 1 + \alpha \cdot ( q - 1)

c.q.d.

figura-2

Para soluções moleculares, o número de partículas de soluto existentes na solução é igual ao número de moléculas que foram dissolvidas no solvente  \Rightarrow q = 1.

Logo, i = 1 + \alpha \cdot ( q - 1)  \Rightarrow i = 1

figura-1

Por exemplo, se dissolvermos 180g de glicose (MM = 180 \frac {g}{mol}) na água, iremos obter uma solução aquosa de glicose contendo 1 mol de moléculas de glicose.

1 C_6H_{12}O_{6(s)} \Rightarrow 1 C_6H{12}O_{6(aq)}
6,02 \cdot 10^{23} moléculas ----- 6,02 \cdot 10^{23} moléculas

Conclusão: nas mesmas condições experimentais, o efeito coligativo das soluções iônicas é sempre maior que o das soluções moleculares.

Molalidade

Por fim, para iniciar o estudo de cada propriedade coligativa específica, vamos aprender como calcular a expressão de concentração utilizada na medição destes efeitos.

A molalidade (\omega) é a unidade de concentração utilizada para este estudo por dois motivos:

  • é a única expressão que relaciona quantidade de soluto dissolvido em determinada massa de solvente (e não de solução);
  • não varia com a temperatura, já que está relacionada à massa de solvente, em vez de volume (lembre-se que o volume de um líquido varia sutilmente com mudanças de temperatura);

A molalidade (\omega) indica a quantidade de matéria de soluto (n_1, em mol) que se encontra dissolvida em 1 quilograma de solvente (m_2, em kg).

Assim, escrevemos (\omega) = \frac{n1(mol)}{m2(kg)}

Por análise dimensional, podemos relacionar a fórmula acima com as massas molares dos compostos, tal que

n_1 = \frac{m1}{M1} \Rightarrow \omega = \frac{m1(g)}{M1(g/mol) . m2 (kg)}

Caso a massa do solvente seja dada em gramas, é só acrescentar mais um fator de conversão, dividindo o termo m_2 por 1000 (g → kg):

 \omega = \frac {m1}{M1 . m2/1000} \Rightarrow \omega = \frac {m1 . 1000}{M1 . m2}

Agora podemos ir ao estudo das propriedades coligativas.