Tipos de binárias

Por Lucas Shoji

Abordaremos nessa seção diversas formas de resolver um exercício sobre estrelas binárias reais (gravitacionalmente ligadas), sejam elas visuais, astrométricas, eclipsantes ou espectroscópicas. Não falaremos das binárias aparentes, que são apenas estrelas que estão na mesma direção visualmente, mas em distâncias diferentes. Muitas dessas estratégias podem ser usadas também para descobrir características de exoplanetas, como veremos a seguir.

Binárias visuais e astrométricas

Binárias visuais são sistemas nos quais conseguimos distinguir as componentes com algum instrumento óptico. Assim conseguimos identificar uma órbita para cada estrela, ou uma órbita relativa como mostrada nessa aula. Conseguimos calcular a razão entre as massas dos componentes do sistema, pela aplicação direta do centro de massa. Também podemos obter a massa total do sistema usando a 3ª lei de Kepler:

P^2={4 \pi^2 \over GM} a^3 \Leftrightarrow M=m_1+m_2= {4 \pi^2 a^3 \over G P^2 } = {4 \pi^2\over G P^2 } \big({\alpha d \over cos i}\big)^3

Em que \alpha é o semi eixo maior angular (observado) do sistema, i é a inclinação da órbita em relação ao plano do céu e d é a distância até o sistema.

Binárias Visuais

Binárias astrométricas são sistemas em que conseguimos ver somente uma componente brilhante, mas notamos a oscilação dela além do movimento próprio. Assim, subtraindo o movimento total do médio (movimento próprio) conseguimos a amplitude da oscilação (semi-eixo maior da órbita dessa estrela) e o período do sistema, que podem ser combinadas com outros dados no enunciado para resolver o exercício. Isso também pode ser aplicado para exoplanetas, visto que eles têm luminosidade desprezível.

Binárias astrométricas

Binárias eclipsantes

Mesmo sem conseguir distinguir visualmente o movimento das estrelas, podemos identificar várias características de sistemas binários observando somente a curva de luz do sistema. Porém, isso só é possível se a órbita estiver aproximadamente alinhada com o plano de observação (como explorado no T2 da IOAA 2017).

Com uma curva de luz, podemos medir quantias como a duração dos eclipses primário e secundário, tanto a duração total (T_P, T_S) quanto o tempo de brilho mínimo (t_P, t_S). As curvas de luz reais não são compostas de retas, mas os períodos de mínimo podem ser identificados com uma descontinuidade na inclinação da curva de luz. Isso é causado pelo chamado escurecimento de borda, que causa um brilho superficial não uniforme na estrela.

Podemos calcular a razão entre os raios das estrelas, supondo o eclipse central:

S=vt \Rightarrow {S_T \over S_t} = {v T_S \over v t_S} \Rightarrow {2(R_1+R_2) \over 2(R_1-R_2)} = {T_S \over t_S} = {T_P \over t_P}\Rightarrow {R_2 \over R_1} = {T_S - t_S \over T_S+t_S}={T_P - t_P \over T_P+t_P}

onde as estrelas 1 e 2 estão na figura.

Quando o eclipse não é central, pela inclinação na órbita, podemos calcular a razão entre os raios por um método semelhante ao descrito no final da ideia 9, ou como no problema T14 da IOAA 2010 (P11 Cap. 3, IOAA book).

Esse método também pode ser aplicado para exoplanetas. Nesse caso, observamos somente um trânsito do planeta sobre a estrela, mas podemos usar isso para descobrir muitas informações sobre o sistema.

Também podemos calcular a razão entre as temperaturas usando a diferença entre os fluxos normal e durante os eclipses, e considerando que o brilho superficial é constante, ou seja, o brilho é proporcional à área visível. Denotando por F_P, F_S e F_o os fluxos no mínimo do eclipse primário, mínimo do eclipse secundário e normal, respectivamente:

F_o=\sigma 4 \pi k(T_1^4R_1^2+T_2^4R_2^2)

F_P=\sigma 4 \pi k T_1^4R_1^2

F_S=\sigma 4 \pi k (T_1^4R_1^2+T_2^4(R_2^2-R_1^2))

Notamos que

{F_o-F_S \over F_o - F_P} = \Big({T_2 \over T_1}\Big)^4

Como a luminosidade de cada estrela é uma função do raio e da temperatura, podemos calcular a razão entre as luminosidades. Usando uma relação massa-luminosidade, conseguimos uma razão também entre as massas.

Binárias Espectroscópicas

E quando não conseguimos ver eclipses? Sim, ainda conseguimos obter informações. Binárias espectroscópicas são aquelas em que podemos distinguir o movimento de uma ou das duas estrelas observando o espectro delas, pelo efeito doppler. Órbitas circulares e no mesmo plano do observador, como considerados na maioria dos problemas, produzem curvas senoides de velocidade radial v_r=v_{cm}+{2\pi a \over P} \sin \theta onde v_{cm} é a velocidade radial do centro de massa (os efeitos de uma excentricidade e inclinação orbital são discutidos melhor no livro (An Introduction to Modern Astrophysics Cap.7 por Carroll e Ostlie).

Analisemos um gráfico de velocidade radial:

Conseguimos obter o período, as velocidades de cada estrela em reelação ao centro de massa e a velocidade do centro de massa do sistema no nosso referencial pelo gráfico. Pelo centro de massa:

{r_1 \over r_2}={a_1 \over a_2} = {v_1\over v_2} = {m_2 \over m_1} (I)

onde a terceira fração foi obtida derivando a primeira.

E ainda, considerando o semi eixo maior do sistema a=a_1+a_2= \sqrt[3]{P^2{G(m_1+m_2)\over4\pi^2}}, e usando v_i=2\pi a_i /P:

a=a_1+a_2={P \over 2 \pi}(v_1+v_2) \Rightarrow m_1+m_2={P \over 2 \pi G}(v_1+v_2)^3 (II)

Resolvendo as equações (I) e (II), conseguimos descobrir as massas individuais de cada estrela.