Astronomia - Ideia: Critério de Jeans

Por Tiago Mariotto Lucio

Nessa ideia, vamos estudar os critérios necessários ao colapso gravitacional de nuvens interestelares. Devido a uma perturbação externa, tais corpos astronômicos, inicialmente em equilíbrio hidrostático, podem colapsar gravitacionalmente, formando protoestrelas em seu centro.

Inicialmente, utilizando o Teorema do Virial para o equilíbrio:

K = - \dfrac{U}{2}

Desprezando quaisquer rotações, turbulências e campos magnéticos:

  • 2K  data-recalc-dims= \left|U\right|" />: expande devido a força de pressão interna.
  • 2K < \left|U\right|: colapsa devido a atração gravitacional.

Podemos calcular a energia potencial gravitacional de uma nuvem esférica de raio R, massa M e densidade constante \rho pelo somatório da energia potencial, a qual atua entre esferas de raio r e massa m(r) e cascas esféricas de raio r, espessura dr e massa dm:

dU = - G\cdot \dfrac{m(r)\cdot dm}{r},        m(r)= \dfrac{4}{3}\cdot \pi\cdot r^3 \cdot \rho,       dm = 4\cdot \pi \cdot \rho \cdot r^2\, dr

dU = - G\cdot \dfrac{16\cdot \pi^2 \cdot \rho^2 \cdot r^5}{3\cdot r}\, dr \Longrightarrow U= - \dfrac{16\cdot \pi^2 \cdot \rho^2 \cdot G}{3} \cdot \displaystyle \int_0^R r^4\, dr

U = - \dfrac{16\cdot \pi^2 \cdot \rho^2 \cdot G \cdot R^5}{15},        \rho = \dfrac{3M}{4\cdot \pi \cdot R^3}

U = - \dfrac{3\cdot G\cdot M^2}{5\cdot R}   (1)

Já para o cálculo da energia cinética, podemos estima-lá por:

K = \dfrac{3}{2}\cdot N\cdot k_B\cdot T   (2)

N = \dfrac{M}{\mu\cdot m_H}

k_B = 1,381\cdot 10^{-23}\, m^2\, kg\, s^{-2}\, K^{-1},        m_H = 1,674\cdot 10^{-27}\, kg

Onde N é a quantidade de partículas, \mu é a massa molecular média \left(\left[\mu\right] = u\right), m_H é a massa de um átomo de hidrogênio e k_B é a constante de Boltzmann.

Substituindo (1) (2) na condição de colapso gravitacional:

3\cdot k_B \cdot T \cdot \dfrac{M}{\mu\cdot m_H} < \dfrac{3\cdot G\cdot M^2}{5\cdot R},        R = \left( \dfrac{3\cdot M}{4\cdot \pi \cdot \rho} \right)^{\frac{1}{3}}

M  data-recalc-dims= \left(\dfrac{5 \cdot k_B\cdot T}{G\cdot \mu\cdot m_H}\right)^{\frac{3}{2}}\cdot \left(\dfrac{3}{4\cdot \pi \cdot \rho}\right)^{\frac{1}{2}}" />

\boxed{M_J \approx \left(\dfrac{5\cdot k_B\cdot T}{G\cdot \mu\cdot m_H}\right)^{\frac{3}{2}}\cdot \left(\dfrac{3}{4\cdot \pi \cdot \rho}\right)^{\frac{1}{2}}}

Ainda, é possível encontrar um comprimento de Jeans \lambda_J tal que caso R data-recalc-dims=\lambda_J" />, a nuvem interestelar irá colapsar. Assumindo a densidade da nuvem \rho constante ao longo de seu interior, temos:

\rho=\dfrac{3M_J}{4\pi\lambda_J^3}

Logo:

\boxed{\lambda_J \approx \left( \dfrac{15\cdot k_B\cdot T}{4\cdot \pi \cdot G\cdot \mu \cdot m_H \cdot \rho} \right)^{\frac{1}{2}}}

Onde M_J é a massa de Jeans e \lambda_J é o comprimento de Jeans. Logo, segundo o critério de instabilidade de Jeans, uma nuvem interestelar irá colapsar se M  data-recalc-dims= M_J" />, que é equivalente a: R  data-recalc-dims= \lambda_J" />.

Exemplo 1: Nuvem de HI

Para uma nuvem de hidrogênio neutro típica \left(n = 5\cdot 10^8\, m^{-3} \Rightarrow \rho = 8,4 \cdot 10^{-19}\, kg\, m^{-3} \right., T = 50\, K e \left.\mu = 1\, g/mol\right):

M_J \approx 2,9\cdot 10^{33}\, kg \Longrightarrow M_J \approx 1500\, M_{\odot}

Como a massa dessas nuvens é estimada para estar entre 1\, M_{\odot} e 100 \, M_{\odot}, elas são estáveis com relação ao colapso gravitacional.

Exemplo 2: Nuvem de Hidrogênio Molecular

Para um núcleo denso de uma de uma grande nuvem molecular \left(n = 10^{10}\, m^{-3} \Rightarrow\rho = 3\cdot 10^{-17}\, kg\, m^{-3}\right., T = 10\, K e \left. \mu = 2\, g/mol\right)) :

M_J \approx 1,5 \cdot 10^{33}\, kg \Longrightarrow M_J \approx 7,7\, M_{\odot}

Como a massa do núcleo dessas nuvens são na ordem de 10\, M_{\odot}, elas aparentemente são instáveis e colapsam pela atração gravitacional, o que é condizente com o fato destas serem as regiões de formação estelar.

Na Presença de uma Pressão Externa

Na demonstração da formula da Massa de Jeans foi desprezada a pressão que um meio externo exerce na nuvem, para esse caso pode ser demonstrado que a massa crítica para que o colapso ocorra é dada pela Massa de Bonnor-Ebert M_{BE}:

M_{BE} = \dfrac{1,18}{P_0^{\frac{1}{2}}\cdot G^{\frac{3}{2}}}\cdot \left( \dfrac{k_B\cdot T}{\mu\cdot m_H} \right)^2

Utilizando essa formula, podemos encontrar um valor mais preciso para a massa crítica de um núcleo de uma nuvem de hidrogênio molecular com a influência da pressão do gás ao redor. Cálculo da pressão P_0 da nuvem no núcleo [Interiores Estelares] (desconsiderando a pressão do meio interestelar e desprezando o raio do núcleo):

\dfrac{dP}{dr} = -\rho\cdot g = - \rho \cdot \dfrac{G\cdot m}{r^2} = - \dfrac{4\cdot\pi\cdot\rho^2\cdot G}{3} \cdot r

\displaystyle \int_{P_0}^{0}\, dP = - \dfrac{4\cdot\pi\cdot\rho^2\cdot G}{3} \displaystyle \int_{0}^{R} r \, dr

P_0 = \dfrac{2\cdot\pi\cdot\rho^2\cdot G\cdot R^2}{3}

P_0 = \dfrac{3\cdot G\cdot M^2}{8\cdot \pi \cdot R^4},        R = \left( \dfrac{3\cdot M}{4\cdot \pi \cdot \rho} \right)^{\frac{1}{3}}

 M_{BE} \approx 0,33\cdot M_J

Obtendo um valor para a massa crítica de aproximadamente 2,6\, M_{\odot}.

Tempo de Colapso

Podemos calcular o tempo para que ocorra o colapso gravitacional t_{ff} (tempo de queda livre) utilizando a Terceira Lei de Kepler para uma elipse degenerada de semi-eixo maior \frac{R}{2} e excentricidade e = 1:

\dfrac{T^2}{\left(\frac{R}{2}\right)^3} = \dfrac{4\cdot \pi^2}{G\cdot M},        \dfrac{R^3}{M} = \dfrac{3}{4\cdot \pi \cdot \rho_0}

T = \left( \dfrac{3\cdot \pi}{8\cdot G\cdot \rho_0} \right)^{\frac{1}{2}},        t_{ff} = \dfrac{T}{2}

\boxed{t_{ff} = \sqrt{\dfrac{3\cdot \pi}{32\cdot G\cdot \rho_0}}}

Perceba que este não depende do tamanho inicial da nuvem, somente de sua densidade t_{ff} \propto \dfrac{1}{\sqrt{\rho}}. Assim podemos estimar o tempo que o núcleo da nuvem molecular do Exemplo 2  demoraria para colapsar:

t_{ff} \approx 3,8 \cdot 10^5\, \hbox{anos}

Exercícios para treinar essa ideia:

1. Exercício Intermediário da Semana 63

2. ROSAOC 2006 - Problema 7

3. SAO 2019 - Problema 3.1

Fonte:

B. Carroll and D. Ostlie. An Introduction to Modern Astrophysics. Cambridge University Press, 2nd edition, 2017.