Astronomia - Ideia: Forças de Maré e o Limite de Roche

Por Giulia Nóbrega

Forças de maré

Na maior parte do tempo, quando resolvendo exercícios, assumimos os planetas e seus satélites como pontuais. Se considerarmos no entanto que estes são corpos extensos, a interação gravitacional entre 2 corpos ganha um novo componente: a força de maré. A força de maré nada mais é do que a força correspondente à diferença da aceleração gravitacional entre 2 pontos de um mesmo corpo devido à interação com um outro corpo.

Como podemos ver na figura abaixo, os pontos mais próximos ao corpo 2 sofrem uma força gravitacional maior (em módulo) e, portanto, estão sujeitos a uma aceleração maior.

Analisando para o sistema Terra-Lua, tomemos um ponto na superfície da Terra que não se encontra na reta que une os centros de massa dos 2 corpos. Neste ponto colocaremos uma massa de teste (m) de tal modo que m\ll M_T e m\ll M_L.

 

Forças gravitacionais da Lua em m (fonte: An Introduction to Modern Astrophysics)

 

Perceba que temos interesse em analisar a situação no referencial da Terra, uma vez que é o referencial em que estamos. Entretanto, a própria Terra acelera para a direita com aceleração \dfrac{GM_L}{r^2} devido à atração gravitacional da Lua. Dessa maneira, para levar em conta que o nosso referencial é não inercial, ou seja, acelera com relação a um referencial inercial, todos os corpos vistos da Terra possuem uma aceleração adicional -\dfrac{GM_L}{r^2}, que equivale a dizermos que uma força fícticia -\dfrac{GM_Lm}{r^2} \hat i aparece em m. Denotemos essa força \vec{F}_C, temos assim:

\vec{F}_C=-\dfrac{GM_Lm}{r^2} \hat i

Para o ponto P, no entanto, a força gravitacional (F_P) possui 2 componentes, sendo eles:

F_{PX}=\frac {GmM_L}{s^2 } cos\phi (Componente horizontal)

F_{PY}=-\frac {GmM_L}{s^2} sen\phi (Componente vertical)

Assim, a força resultante \Delta \vec{F} é:

\Delta \vec{F}=\vec{F}_P+\vec{F}_C= GmM_L(\frac {cos\phi}{s^2}-\frac{1}{r^2})\hat i-\frac{GmM_L}{s^2}sen\phi \hat j

Pela geometria, encontramos s^2:

s^2=(r-Rcos\theta)^2 + (Rsin\theta)^2

s^2=r^2-2rRcos\theta+R^2sin^2\theta+R^2cos\theta=r^2-2rRcos\theta+R^2

Assumindo R \ll r, temos:

s^2=r^2(1-\frac {2R}{r}cos\theta)

Tomando que (1+x)^{-1}=1-x para x\ll 1:

s^{-2}=\frac{1}{r^2}(1+\frac {2R}{2} cos\theta)

Substituindo na equação para a força diferencial:

\Delta \vec{F}=\frac {GmM_LR}{r^2}[cos\phi(1+\frac{2R}{r}cos\theta)-1] \hat i - \frac {GmM_L}{r^2}(1+\frac {2R}{r}cos\theta)sen\phi \hat j

Temos para \phi muito pequeno:

cos\phi=1

R sen\theta=s sen\phi \implies sen \phi = \frac {Rsen\theta}{r}

Logo, a força diferencial é:

\Delta \vec{F}=\frac{GmM_LR}{r^3}(2cos\theta \hat i-sen\theta \hat j)

Em módulo:

\Delta F=\frac{GmM_LR}{r^3}\sqrt{(3cos^2\theta+1)}

Limite de Roche

Quando tratamos de corpos muito grandes em órbita, as forças de maré acabam por ser maiores entre o núcleo e a superfície deste corpo. Se essas forças forem maiores que a atração gravitacional gerada pela massa do próprio corpo, ele se despedaça.

O máximo raio orbital de um corpo para que ele seja despedaçado pelas forças de maré é chamado de Limite de Roche. Em termos matemáticos, temos para um corpo em órbita de massa m e raio R a uma distância d do corpo que orbita, que possui massa M e raio R' (Note que estamos utilizando as expressões acima no caso limite em que \theta=0):

\frac{Gm}{R^2}<\frac{2GM}{d^3}

A equação acima pode ser interpretada de uma maneira simples. No referencial de m, uma massa de teste \mu que está sobre a sua superfície sofre uma força gravitacional devido ao próprio m, uma força de contato N e a força de maré. No limite de descolamento, N=0 e temos o equilíbrio entre a força gravitacional e a força de maré, porém caso esta ultrapasse a força gravitacional, temos a equação acima.

Sejam \rho e \rho ' as densidades médias do corpo orbitante e do corpo central:

\frac{G4\pi R^3}{3R^2}<\frac{2G4\pi R'^3}{3d^3}

d^3<2\frac{\rho'}{\rho}R'^3

Exercícios:

IOAA 2008 Exercício 8

IOAA 2015 Questão Curta 13

SAO 2019 Questão Média 3 (Space City)

Barra do Piraí 2019 Prova P1-Parte 2 Questão 13 (Aplicação da fórmula)

(Morin) Mostre que se o planeta de massa m orbitasse M em uma órbita síncrona, o novo "limite de Roche" seria:

d^3<3\frac{\rho'}{\rho}R'^3

Fonte:

B. Carroll and D. Ostlie. An Introduction to Modern Astrophysics. Cambridge University Press, 2nd edition, 2017.

Recomendação de Leitura Adicional: (Por Bruno Makoto):

Introduction to Classical Mechanics. David Morin - Capítulo 10, seção 3 (Tides). Também é recomendado fazer os problemas e exercícios do fim do capítulo