Astronomia - Ideia: Iteração na Astronomia

Por Lucas Shoji

Muitas vezes em astronomia nos deparamos com equações que são difíceis ou impossíveis de serem resolvidos analiticamente, sendo importante o conhecimento dos métodos iterativos para a solução numérica da equação. Existem muitos métodos, dos quais vamos apresentar dois:

1. Iteração de ponto fixo

A iteração de ponto fixo na calculadora consiste em isolar um dos x que aparecem na equação, e aplicar repetidamente a função isolada nesse x. Esse processo pode ser representado pelo seguinte gráfico:

Ponto fixo

onde a diagonal é a reta y=x, e o x converge para seu valor real. Podemos equacionar também como x_{n+1} = f(x_n).

Praticamente, a iteração na calculadora se resume aos seguintes passos:

  1. Chutar um valor aproximado para a raiz da equação, e colocar esse valor na calculadora.
  2. Isolar um dos x que aparecem na equação, e colocar essa expressão substituindo os x por Ans na calculadora.
  3. Apertar repetidamente o botão = até convergir em um valor.
  4. Se não convergir, tentar isolar um outro x e repetir o passo 3, e conferir se o valor chutado em 1 é plausível.
  5. Se ainda não convergir, esse método não funciona para essa equação. Tente outro método numérico ou procure pensar se precisa necessariamente resolver a equação para resolver o exercício

Exemplificando pela equação xe^x=10:

  1. x \approx 2, então apertamos 2 e depois =. Assim, a calculadora armazenou esse valor na variável Ans.
  2. Digitar ln\bigg({10\over Ans}\bigg) ou {10\over e^{Ans}} na calculadora.
  3. Apertando = muitas vezes, percebemos que a primeira equação converge para x \approx 1.746. Se tivéssemos escolhido a segunda expressão, perceberíamos que essa diverge e tentaríamos isolar o outro x (Passo 4), dando o mesmo resultado.

Vamos ver agora a aplicação na astronomia:

Uma estrela tem magnitude absoluta M=-2,00 e magnitude aparente m=8,00, localizada numa região de extinção interestelar média 2,00 mag/kpc. Encontre a distância até a estrela.

Escrevendo a equação da magnitude absoluta com extinção:

m-M = 5log \big({{d}\over{10pc}}\big) + ad

Substituindo os valores e isolando um dos d's:

d = 10^{3-0.0004d}  (em parsecs)

Vamos colocar o chute inicial como de d \approx 1000pc na variável Ans, o valor sem a extinção.

(Apertar 1000 e =)

Colocando os valores na calculadora:

10^{3-0.0004Ans}

Apertando = algumas vezes, descobrimos que o velor converge para algo próximo de 583,98877.

Considerando os algarismos significativos: d=584pc

Apesar de ser bem prático, esse tipo de iteração pode ser demorado e só funciona para alguns tipos específicos de funções (as polinomiais não estão dentro, por exemplo. Vamos ver agora um outro método, mais trabalhoso porém mais rápido:

2. Método de Newton-Raphson

Esse método é relacionado com a aproximação linear nos pontos que chutamos os valores. Pegamos a tangente (derivada) de uma função f(x) para um x_0, e calculamos a raiz para essa aproximação linear f_n(x) = f'(x_0) (x_0-x), e substituímos ela no f(x) para repetir o processo. Pelo triângulo abaixo:

\tan \beta = f'(x_n) = {{f(x_n)}\over{x_n-x_{n+1}}}

Logo:

\boxed{x_{n+1} = x_n - {f(x_n)\over{f'(x_n)}}}

A animação abaixo pode ajudar na sua compreensão:

 

Vamos exemplificar pela equação de Kepler:

Qual a anomalia excêntrica do cometa Halley t \approx 5,00 anos após sua passagem no periélio? É dada a excentricidade de sua órbita, e = 0,967 e seu período, P = 75,3 anos.

A anomalia média do cometa é:

M = {{2\pi t}\over{P}} = {{2\pi \times 5,00}\over{75,3}} \approx 0,417 rad

Podemos armazenar esse valor em uma variável da calculadora, por exemplo na M.

Derivando a equação de Kepler, que relaciona a anomalia média M, a anomalia excêntrica E e a excentricidade e:

f (E) = e \sin E - E + M \Rightarrow f' = e \cos E - 1

Perceba que estamos procurando o valor de E que satisfaz f(E)=0, ou seja, que obedeça a equação de Kepler, e é justamente isso que a animação representa - a cada etapa ficamos mais próximos do ponto em que f(E) é nulo.

Vamos primeiramente chutar a anomalia média 0,417 para o x_0. (Apertar 0.417 e =)

Colocando a fórmula na calculadora:

Ans + {{0.967 \sin (Ans)-Ans+0,417}\over{1-0.967 \cos (Ans)}}

Apertando = aproximadamente 5 vezes o valor converge para E = 1,36 rad. Seria possível resolver essa equação por meio da iteração de ponto fixo, mas demoraria muito mais para convergir. Portanto, é importante sempre pensar quando um método ou outro é melhor/mais rápido para cada situação.

OBS: Não esqueça de colocar sua calculadora no modo RAD (radianos) para esse exemplo.

 

Exercícios que usam essa ideia como um passo da resolução:

  • A magnitude na banda de uma estrela é V = 15,1, o índice de cor  B-V = 1,6, e a magnitude absoluta V_0 = 1.3. A extinção média nessa banda para a direção da estrela é de \alpha_v = 1 mag/kpc. Qual é a cor intrínseca (B-V)_0 da estrela?
  • T12 IOAA 2017
  • Q6 SAO 2016