Aula 5.4 - Condutores, Indução e Capacitância

Escrito por Ualype Uchôa 

Na aula a seguir, trataremos de materiais condutores, definindo-os e mostrando propriedades e características. Também discutiremos sobre o fenômeno de indução e definiremos uma grandeza chamada de capacitância, que terá uma importância extrema. Será usado um pouco de cálculo diferencial em algumas seções.

Condutores

Condutores, como o nome sugere, são materiais que permitem, com facilidade, a movimentação de cargas elétricas. No entanto, essa definição não nos é suficiente: para entendermos como funcionam materiais condutores, devemos investigar suas características. Aqui, lidaremos apenas com condutores em equilíbrio eletrostático; isto é, aqueles nos quais as cargas estão em repouso.

1. Distribuição de cargas

Como as cargas em excesso em um condutor isolado são de mesmo sinal, há repulsão entre elas, as quais buscam a maior distância umas das outras, indo assim para a superfície. Sendo assim, as cargas em excesso distribuem-se sobre a superfície externa:

Figura 1: Condutor positivamente carregado, com as cargas distribuídas em sua superfície.

Esse fato foi verificado experimentalmente várias vezes na história, por exemplo, nos experimentos de Benjamin Franklin, de Faraday e de Cavendish. Você também pode chegar nessa conclusão em termos de energia; a natureza sempre busca minimizar a energia de sistemas, e essa é a distribuição de cargas que alcança tal objetivo (compare a energia de uma esfera condutora com a de uma esfera isolante!).

2. O campo elétrico

Como já vimos no exemplo da esfera condutora (na Aula 5.2), o campo elétrico no interior de um condutor é nulo (independente do formato), pois, caso não fosse, haveria uma força resultante nos elétrons livres em seu interior, o que nos tiraria da situação de equilíbrio eletrostático.

Para um ponto na superfície, o campo elétrico é não-nulo  (a não ser que o condutor seja plano e tenha distribuição uniforme de carga) e perpendicular à esta. Consequentemente, o campo em pontos muito próximos à superfície também. A perpendicularidade é justificada pois a existência de uma componente tangencial do campo provocaria uma força nas cargas, deslocando-as, o que tira o condutor do regime de equilíbrio. O campo próximo à superfície (para um determinado ponto) pode ser calculado através da lei de Gauss, utilizando-se uma "pillbox" de secção reta A que fura a superfície externa do condutor. O fluxo é apenas E_{prox.}A, pois o campo interno é nulo. Logo:

E_{prox.}A=\dfrac{\sigma A}{\epsilon_0},

E_{prox.}=\dfrac{\sigma}{\epsilon_0}.

Onde \sigma é a densidade sup. de carga naquele ponto.

3. Potencial elétrico

Outra propriedade importante é que um condutor é uma equipotencial: o potencial elétrico em um ponto qualquer de um condutor (na superfície ou em seu interior) é o mesmo. Verificamos esse fato no exemplo da esfera condutora (Aula 5.2), mas ele vale para um condutor de formato arbitrário: na superfície, não há componente tangencial do campo, e, por consequência, não há D.D.P entre pontos na superfície. Já no seu interior, o campo resultante é nulo, então uma D.D.P não pode ser gerada e o potencial é igual para pontos internos ou na superfície.

Indução de cargas

Um fenômeno importantíssimo a ser analisado é o das cargas induzidas. Primeiramente, imaginemos um cenário simples: colocamos uma carga +q próxima a um condutor neutro:

Figura 2: Carga +q induzindo cargas em um condutor inicialmente neutro.

Na parte mais próxima da carga +q (o indutor), ficarão concentradas as cargas induzidas negativas devido à atração, e, no outro lado, as cargas induzidas positivas devido à repulsão. Podemos, então, definir a indução como sendo o rearranjo de cargas em um certo corpo devido à presença de um campo elétrico gerado por outro corpo. Agora, considere um cenário "mais complexo": um condutor neutro possui uma cavidade de formato arbitrário em seu interior, e, dentro desta cavidade, há uma carga +q:

Figura 3: Condutor com uma cavidade em seu interior, e, dentro desta, uma carga +q.

O campo elétrico dentro da cavidade, onde se encontra +q não será nulo; no entanto, o campo na região entre a cavidade e a superfície do condutor sim, pela definição de um condutor. A carga +q irá induzir uma carga negativa -q nas paredes da cavidade, e, por conseguinte, esta última induzirá uma carga positiva +q na superfície do condutor. Por quê?

Escolhendo uma superfície gaussiana que envolve a cavidade, \displaystyle \oint \vec{E} \cdot d\vec{A}=0 (pois E=0 dentro do condutor), e, portanto q_{int}=0. Mas q_{int}=q+q_{ind}, logo, a carga induzida nas paredes da cavidade é q_{ind}=-q, e, como o condutor é neutra, a carga induzida na superfície será +q. Imagine, agora, o mesmo condutor mas com a cavidade interior sem carga. Nessa situação, o campo elétrico dentro da cavidade será nulo (a demonstração fica como exercício para o leitor!).

Capacitância

Através de experimentos, verificou-se que a carga de um corpo condutor eletrizado é diretamente proporcional ao seu potencial:

Q=CV.

A esta constante de proporcionalidade, damos o nome de capacitância. Ela depende apenas da geometria do corpo, ou seja, de como ele foi construído. A capacitância, fisicamente falando, mede a eficiência de um condutor em armazenar carga; sendo assim, quanto maior a capacitância de um condutor, mais carga ele conseguirá armazenar. Sua unidade no SI é o farad (F), em homenagem ao cientista Michael Faraday (1791-1867). Ele equivale a 1 coulomb/1 volt. Agora que temos a definição em mãos, calculemos as capacitâncias dos três tipos mais comuns de capacitores (será necessário um pouco de cálculo, mas, novamente, chamo a atenção para os resultados derivados).

Exemplo 1: Capacitor de placas paralelas

Um capacitor de placas paralelas é composto por duas placas de área A, a uma pequena distância d entre si. Uma das placas carrega carga Q, e a outra -Q, ambas distribuídas uniformemente sobre as superfícies. Determine a capacitância do sistema.

Solução:

Para encontrarmos a capacitância do sistema, devemos saber a D.D.P entre as placas, e, para acharmos a D.D.P, precisamos do campo elétrico nessa região.

Como a distância d é pequena, as placas, que são finitas, comportam-se aproximadamente como placas infinitas no que diz respeito ao campo elétrico. Assim, o módulo do campo elétrico nessa região será:

E=\dfrac{\sigma}{2 \epsilon_0}-\left(-\dfrac{\sigma}{2 \epsilon_0}\right)=\dfrac{\sigma}{\epsilon_0},

com \sigma=\dfrac{Q}{A}. Como o campo é uniforme, vale, em módulo:

\Delta V= Ed=\dfrac{Qd}{\epsilon_0 A}.

Daí, facilmente encontramos a capacitância do capacitor plano:

Q=C \Delta V=\dfrac{CQd}{\epsilon_0 A},

C=\dfrac{\epsilon_0 A}{d}.

Perceba que ela depende apenas das propriedades geométricas (área e distância entre as placas) do sistema.

Exemplo 2: Capacitor esférico

O capacitor esférico é composto de duas cascas esféricas condutoras; uma interna, de raio R_1 e carga Q uniformemente distribuída sobre a superfície, e outra externa, de raio R_2 e carga -Q também uniformemente distribuída. Determine a capacitância desse sistema e particularize seu resultado para o caso em que R_2 tende a infinito.

Solução: 

O campo elétrico na região "vazia" entre as duas cascas varia com a distância r ao centro e possui intensidade

E=\dfrac{1}{4 \pi \epsilon_0}\dfrac{Q}{r^2}.

Lembrando da definição de potencial, achamos a D.D.P. entre as cascas interna e externa:

Delta V=-\displaystyle \int_{R_1}^{R_2} \dfrac{1}{4 \pi \epsilon_0}\dfrac{Q}{r^2} dr= \dfrac{Q}{4 \pi \epsilon_0} \left(\dfrac{1}{R_2}-\dfrac{1}{R_1}\right).

A partir disso, achamos a capacitância do capacitor esférico:

Q=C \Delta V

C= 4 \pi \epsilon_0\dfrac{R_1 R_2}{R_2-R_1}.

Perceba que, no caso em que R_2 tende ao infinito, o termo R_1 torna-se desprezível, e, então, a capacitância passa a ser independente de R_2 e igual a

C=4 \pi \epsilon_0 R_1=\dfrac{R_1}{K_0},

como era de se esperar (aplique a definição de capacitância para uma esfera condutora e verifique!).

Exemplo 3: Capacitor cilíndrico

Um capacitor é composto de dois cilindros concêntricos de comprimento L; um interno com de raio R_1 e carga Q e um externo de carga -Q e raio R_2, ambas distribuídas uniformemente. Determine a capacitância do sistema.

Solução: Assim como no Exemplo 1, faremos uma aproximação: a de que os cilindros são muito longos. Essa aproximação nos permitirá determinar o campo no espaço entre os dois cilindros como função da distância radial, mediante a expressão para o campo de um fio infinito (é fácil ver que, para pontos externos a um cilindro muito longo, o campo se comporta da mesma forma que de um fio infinito, mas você provar sem dificuldades utilizando a lei de Gauss):

E=\dfrac{1}{2 \pi \epsilon_0}\dfrac{\lambda}{r}.

Com \lambda=\dfrac{Q}{L} sendo a densidade linear de carga. Assim, podemos integrar para achar o potencial:

|\Delta V|=\displaystyle \int_{R_1}^{R_2} \dfrac{1}{2 \pi \epsilon_0}\dfrac{Q}{L} \dfrac{dr}{r}=\dfrac{Q}{2 \pi \epsilon_0 L } ln\left(\dfrac{R_2}{R_1}\right).

E, com isso, encontramos a capacitância do capacitor cilíndrico:

C=\dfrac{2 \pi \epsilon_0 L }{ ln\left(\dfrac{R_2}{R_1}\right)}.

Equilíbrio eletrostático entre condutores

Imagine N condutores, de carga Q_A,Q_B...Q_N,potenciais V_A,V_B...V_N e capacitâncias C_A, C_B,...C_N inicialmente afastados entre si. Se os ligarmos por meio de fios muito finos (ou pusermos todos eles em contato simultâneo entre si), as cargas se movimentarão devido à diferença de potencial entre eles, até um certo momento, no qual todos os condutores possuirão o mesmo potencial elétrico, entrando em equilíbrio eletrostático entre si, com cargas finais Q_A',Q_B'...Q_N'. Pela igualdade dos potenciais:

V_A'=V_B'=...=V_N'=V.

O Princípio da Conservação da Carga nos diz que:

Q_A+Q_B+...+Q_N=Q_A'+Q_B'+...+Q_N'.

Mas, como vale que Q=CV:

C_A V_A + C_B V_B +...+C_N V_N=(C_A+C_B+...+C_N)V,

Logo, o potencial final é

V=\dfrac{C_A V_A + C_B V_B +...+C_N V_N}{C_A+C_B+...+C_N},

uma média ponderada entre os potenciais e capacitâncias. Para corpos iguais de capacitância C:

V=\dfrac{V_A+V_B+...+V_N}{N},

CV=Q_{final}=\dfrac{\displaystyle \sum_{i=A}^{N}Q_i}{N}=Q_{final}.

Descobrimos, então, que no caso de corpos idênticos, a carga final é a mesma e igual a média aritmética das cargas iniciais (como havíamos discutido na Aula 5.0).

Energia potencial de um condutor (auto-energia)

Suponha que um condutor esteja inicialmente neutro, e desejamos adicionar a este uma carga Q. Nesse processo, realizamos trabalho, pois, ao adicionar novas cargas no objeto, é necessário vencer as forças repulsivas devido às cargas já existente. Esse trabalho é exatamente a energia potencial eletrostática do sistema (chamada também de auto energia), e é calculado através de:

U= \displaystyle \int Vdq.

Ou, caso prefira, por meio da área embaixo do gráfico Potencial versus Carga. Sabemos que, em um condutor, a relação linear entre carga e potencial fornece o gráfico abaixo:

Figura 4: Gráfico do potencial versus carga para um condutor.

Logo, obtemos a energia potencial eletrostática do condutor calculando o valor numérico da área abaixo do gráfico (área do triângulo):

U=\dfrac{QV}{2}=\dfrac{CV^2}{2}=\dfrac{Q^2}{2C}.

Para uma esfera condutora, por exemplo, para a qual V=KQ/R, obtemos

U=\dfrac{KQ^2}{2R},

conforme havíamos achado na aula anterior utilizando outro método.

Capacitores com um dielétrico

Já estudamos o capacitor de placas paralelas; mas, agora, imagine que preenchamos o seu interior com um dielétrico: uma substância/material que possui uma permissividade \epsilon maior que a do vácuo. Definindo k=\dfrac{\epsilon}{\epsilon_0} como a constante dielétrica do material, a capacitância aumentará de um fator de:

C=kC_0=\dfrac{k \epsilon_0 A}{d}.

Onde C_0 é a capacitância no vácuo. Isto ocorre pois as moléculas do dielétrico são polarizadas devido à ação do campo do capacitor, o que gera uma carga residual chamada de "carga de polarização", criando um campo oposto àquele gerado pelo capacitor. Esse resultado também vale para capacitores de qualquer formato.

OBS.: Materiais dielétricos são isolantes. Porém, se um valor suficientemente alto de campo elétrico externo (a chamada rigidez dielétrica) for aplicado, as moléculas do material podem ser ionizadas, e este torna-se, assim, um condutor! Esse fenômeno é chamado de ruptura dielétrica e é o principal agente por trás de descargas elétricas nas nuvens, por exemplo.