Escala de magnitudes

Por Lucas Shoji

Definição da escala de magnitudes

Vimos na aula passada que o brilho, ou seja, o fluxo cai com o quadrado da distância até uma estrela. Podemos estimar o brilho de uma estrela comum, idêntica ao Sol, a uma distância interestelar comum, digamos, 5 kpc. Como 5kpc \approx 10^9UA, a estrela seria (10^9)^2=10^{18} vezes menos brilhante que o Sol. Esse é um número muito pequeno! Para deixar a notação mais palpável, e fácil de visualizar (entre outros motivos históricos), os astrônomos criaram a escala de magnitudes.

A escala de magnitudes é uma escala logarítmica de fluxo em que uma estrela de magnitude m=1 é 100 vezes mais brilhante do que uma estrela de magnitude m=6. Ok, mas como relaciono isso com o fluxo? Vamos descobrir. Começaremos escrevendo

{F_1 \over F_6}=100 \Rightarrow {F_1 \over F_2}{F_2 \over F_3}{F_3 \over F_4}{F_4 \over F_5}{F_5 \over F_6}=100

Como a escala é logarítmica, a razão entre dois fluxos de magnitudes consecutivas é a mesma, f:

{F_1 \over F_2}={F_2 \over F_3}={F_3 \over F_4}={F_4 \over F_5}={F_5 \over F_6}=f \Rightarrow f^5=100=10^2\Rightarrow f=10^{2/5}

Usando mais uma vez as propriedades do logaritmo, como a razão entre fluxos de estrelas que têm diferença de magnitude \Delta m=-1 é f (o menos vem do fato da magnitude diminuir e o fluxo aumentar), para \Delta m = -2 a razão deve ser f^2. Assim, para duas estrelas com diferença de magnitude \Delta m, a razão entre os fluxos deverá ser f^{-\Delta m}:

f^{-\Delta m}={F_a \over F_b}\Rightarrow 10^{0,4(m_b-m_a)}={F_a \over F_b}\Rightarrow \boxed{m_a-m_b=-2,5 \log\Big({F_a \over F_b}\Big) \Leftrightarrow {F_a \over F_b}=10^{-0,4(m_a-m_b)}}

Essas são as equações que você vai usar em praticamente todos os exercícios de magnitudes.

Alguns outros fatos importantes que podem ser cobrados são que o limiar da capacidade de detecção do olho humano comum está em m=6, e que Vega, α Lyrae, foi utilizada inicialmente para a calibração da magnitude m=0. Atualmente, com a descoberta da variação do brilho das estrelas, usa-se um outro método mais estável para calibrar esse sistema, mas mesmo assim a magnitude de Vega é bem próxima de 0.

Exemplo: Sistema binário

Vamos aplicar a escala que acabamos de criar para o seguinte problema: sabendo as magnitudes das componentes individuais de um sistema binário m_a e m_b, como consigo achar a magnitude combinada, m_c, que vemos no céu?

Sabemos que {F_a \over F_b}=10^{-0,4(m_a-m_b)} .

Também, o fluxo combinado que observamos é F_c=F_a+F_b. Aplicando a equação da magnitude:

m_c-m_b=-2,5 \log\Big({F_c \over F_b}\Big)=-2,5 \log\Big({F_a+F_b \over F_b}\Big)=-2,5 \log\Big({F_a \over F_b}+1\Big)

Substituindo F_a/F_b e isolando m_c, temos finalmente:

m_c=m_b-2,5 \log\Big(10^{-0,4(m_a-m_b)}+1\Big)

Outros conceitos

Quando falamos de magnitudes, nós normalmente falamos da magnitude no visível, composta pela luz no espectro visível ao olho humano. Porém, na maioria dos problemas astrofísicos, precisamos saber a magnitude composta pelo fluxo total, ou seja, em todas as frequências. Chamamos essa magnitude de magnitude bolométrica, m_{bol}. O fluxo total é o fluxo visível vezes um certo fator multiplicativo. Como em um logaritmo um fator multiplicativo torna-se um fator aditivo, podemos definir esse fator como uma correção bolométrica, BC. Assim, sendo m_v a magnitude visível:

\boxed{m_{bol}=m_v-|BC|}

O módulo está na equação pois não há consenso de qual lado colocar o BC, levando a valores opostos dele. Podemos sempre chegar na equação certa sabendo que o fluxo total obviamente é maior que o fluxo visível, portanto m_{bol}<m_v.

Outro conceito importante é a magnitude absoluta, M, que é a magnitude de uma estrela vista a 10pc de distância dela. A magnitude absoluta pode ser pensada como se fosse um análogo da luminosidade para as magnitudes, já que ela é, como o nome diz, absoluta. Podemos deduzir a relação entre a magnitude aparente e a absoluta:

m-M=-2,5 \log\Big({F_m \over F_M}\Big)=-2,5 \log\Big({L \over 4 \pi d^2} {4 \pi (10 pc)^2 \over L}\Big)=-2,5 \log\Big({(10 pc)^2 \over d^2}\Big)\Rightarrow \boxed{m-M=5log\Big({d \over 10 pc}\Big)}

O termo da esquerda, m-M, também é conhecido como módulo de distância.

Também, outra definição aparece de vez em quando é quando consideramos a magnitude superficial \mu de um objeto extenso. Expressada em mag/arcsec², a magnitude superficial é um análogo da magnitude para a intensidade:

\boxed{\mu_1-\mu_2=-2,5 \log\Big({I_1\over I_2}\Big)\Rightarrow \mu=m+2,5 \log\Big({\omega \over arcsec^2}\Big)}

onde I é a intensidade e \omega o ângulo sólido. Muitas vezes, como os ângulos envolvidos são muito pequenos e portanto a superfície da esfera pode ser aproximada para um plano. Então, o ângulo sólido usado na intensidade é aproximado para uma "área angular", justificando assim o "arcsec²". Por exemplo, uma galáxia esférica de diâmetro angular 2" tem área angular \pi arcsec².

Exercícios

1. Quantas Sirius (m=-1,46) precisaríamos para obtermos o mesmo brilho do Sol?

2. Um sistema trinário é composto por duas estrelas de magnitude absoluta 3 e outra de 5.

a) Qual a magnitude absoluta combinada do sistema?

b) Supondo que o sistema esteja com magnitude aparente m_0=2 agora, e que o sistema esteja se afastando de nós a v_r=10km/s, quando a estrela deixará de ser visível?

3. Assuma que todas as estrelas têm mesma magnitude absoluta e estão distribuídos homogeneamente pelo espaço. Seja N(m) o número de estrelas mais brilhantes que a magnitude m. Ache a razão N(m+1) \over N(m).