Por Fabrizio Ferro
Na física o conceito fundamental é o evento. A colisão de duas partículas é um evento, a emissão de um fóton é um evento. Como vimos na seção anterior, qualquer par de referenciais inerciais, independente da velocidade relativa entre eles, concordam sobre o intervalo entre qualquer par de eventos. Resumindo, podemos descrever e localizar eventos sem o uso de sistemas de referência. Entretanto, humanos gostam de estabelecer sistemas de referências, pois eles são úteis para nossas necessidades práticas.
O esquema de transformações das coordenadas de um evento em um referencial inercial para outro é geralmente chamado de “Transformações de Lorentz”. Sua utilidade depende da aplicação e do usuário. Alguns raramente usam, pois sempre lidam com intervalos. Outros sempre usam, pois sempre lidam com referenciais. De qualquer forma, a transformação de Lorentz é uma ferramenta poderosa: ela traz a habilidade de transformar coordenadas de referencial para referencial, ajudam a prever a adição de velocidades e descrevem o efeito Doppler.
Transformações de Lorentz
Assim como na seção anterior, vamos considerar dois referenciais e movendo com velocidade relativa constante. Os eixos das coordenadas espaciais foram escolhidos de forma com que os eixos e coincidam, e os eixos e sejam paralelos aos eixos e respectivamente. Para simplificar, vamos considerar que o movimento relativo se dá no eixo (a escolha do eixo não irá interferir na análise nem no resultado), com velocidade relativa . Como o movimento se dá no eixo , as coordenadas transversais a direção do movimento relativo (i.e. e ) são as mesmas em ambos os referenciais, ou seja:
Vamos também considerar dois eventos que ocorrem na origem do sistema de referência (i.e. ) separados por um tempo . No sistema de referência , a separação espacial entre os eventos é:
(1)
Da invariância do intervalo, temos:
(para )
Introduzindo o fator :
(para ) (2)
Substituindo na equação (1), temos:
(para ) (3)
Para obtermos transformações genéricas para qualquer , teremos que descobrir a forma geral da Transformação de Lorentz. Será deixado como um exercício para o leitor provar que a Transformação de Lorentz é linear, e segue a forma:
(4)
(5)
Comparando as equações (2) e (3) com (4) e (5) podemos perceber que:
Logo:
Novamente utilizando a invariância do intervalo, temos:
Expandindo e agrupando:
(6)
Mas é impossível satisfazer a equação acima com valores únicos de e a não ser que o termo que contém desapareça, ou seja:
(7)
Além disso, e devem fazer com que o coeficiente seja igual nos dois lados da equação (6), consequentemente:
(8)
Substituindo (7) em (8):
Com , podemos obter e, consequentemente, a expressão final da Transformação de Lorentz.
(9)
É interessante notar que no limite a transformação de Lorentz se reduz a transformação Galileana.
Transformação de Velocidades
Na subseção anterior, descobrimo as fórmulas que relacionam as coordenadas de um eventos em diferentes sistemas de referência. Agora, vamos descobrir a fórmula que relaciona a velocidade de uma partícula em um sistema de referência com a sua velocidade em outro sistema de referência. Vamos considerar, novamente, dois referenciais e se movimentando com velocidade relativa , no eixo . De (9), temos:
(10)
Dividindo a segunda pela primeira equação:
Sendo que é a velocidade da partícula no referencial , e é a velocidade da partícula no referencial . Podemos adotar e , obtendo:
(11)
Vale notar que no limite a equação acima se reduz a , de acordo com o limite clássico. Além disso, para qualquer valor de , se então .