Soluções Linguística - Semana 13

INICIANTE

Ao estudar o Guarani Mbyá, um dos dialetos da língua Guarani, percebemos uma característica notável na maneira como os verbos são conjugados. Ao contrário do português, onde a pessoa do verbo é indicada no final da palavra, no Guarani Mbyá, essa informação é indicada por prefixos colocados no início da palavra.

Ao comparar as frases 'eu corro' (anha) e 'você corre' (renha), fica evidente que a pessoa do verbo é indicada por um prefixo. Observando outros verbos, notamos que existem duas formas para a primeira pessoa (quem fala) e duas para a segunda (quem ouve), que parecem variar dependendo do verbo em questão. Na primeira pessoa, o prefixo pode ser 'a-' ou 'xe-'; na segunda, pode ser 're-' ou 'nde-'.

Para entender melhor essa variação, podemos agrupar os verbos que ocorrem com cada tipo de prefixo:
• Grupo 1 ('a-' / 're-')
• Grupo 2 ('xe-' / 'nde-')

Os verbos do grupo 1 são ativos ou eventivos, ou seja, costumam denotar ações dinâmicas. No grupo 2, os verbos são estativos ou descritivos, ou seja, denotam estados ou acontecimentos. Essa divisão em duas classes afeta os verbos intransitivos da língua guarani. Com essa compreensão, podemos então aplicar essa lógica para conjugar os verbos solicitados na questão:

1. Para "eu corto lenha", que é uma ação dinâmica, usamos o prefixo do grupo 1 para a primeira pessoa, resultando em: a-jape’ava.
2. Para "você chora", que é um estado, usamos o prefixo do grupo 2 para a segunda pessoa, resultando em: nde-piary.
3. Para "você dança", que é uma ação dinâmica, usamos o prefixo do grupo 1 para a segunda pessoa, resultando em: re-jeroky.
4. Para "eu tenho feitiço", que é um estado, usamos o prefixo do grupo 2 para a primeira pessoa, resultando em: xe-paje.

Portanto, a resposta correta para a questão é a alternativa A.

INTERMEDIÁRIO

A primeira informação que podemos utilizar para resolver o problema é a relação que o enunciado dá da primeira língua com sua transcrição para o alfabeto latino:

devānaṁpiye piyadasi lājā hevaṁ āhā ye atikaṁtaṁ

Primeiramente, podemos perceber que as palavras são ordenadas da esquerda para a direita. Isso pode ser feito notando os espaçamentos (assumindo que cada espaço na escrita também é um espaço na escrita latina), com palavras mais curtas "concentradas" do lado direito. Assim, sabemos a ordem das palavras, mas não necessariamente a ordem dos caracteres dentro das palavras.

O segundo detalhe notável é o "pontinho" que aparece junto a alguns caracteres. Estabelecendo um paralelo com a transliteração, percebemos que esses pontos coincidem com as nasais "" e, de quebra, que os grafemas também são escritos da esquerda para a direita. Essa nasal ṁ é representada por um diacrítico especial e pode ser observada nas escritas derivadas, como os abugidas devanagari e cingalês.

Por último (mas não menos importante!), notamos que, para cada grafema do brâmi, há uma consoante. Quanto às vogais, elas variam de acordo com marcações específicas (no caso, diacríticos). Assim, sabemos que se trata de um abugida.

As marcações podem ser observadas comparando símbolos para as mesmas consoantes nessa linha:

 ya vs  ye;

va va (com a nasal ṁ) vs ā ;

i pi vs si  si vs ti.

A partir daí, notamos que a marcação de diacríticos se dá através de "traços" no topo de cada consoante (ou, se necessário, no lado direito desse símbolo). A consoante e é marcada por um traço horizontal à esquerda; a consoante ā é marcada por um traço horizontal à direita; a consoante i é marcada por um traço vertical; e a consoante a é implícita quando não há marcação.

Sabendo como as marcações vocálicas funcionam e tendo as transliterações de várias consoantes (em ordem de aparição: d, v, n, p, y, s, l, j, h, v, (nenhuma consoante ou apenas "a"), t, k), podemos transcrever grande parte do texto original. Segue esse texto e parte de sua transcrição, com pontos de interrogação representando consoantes e pontos de exclamações representando vogais desconhecidas:

devānaṁpiye piyadasi lājā hevaṁ āhā ye atikaṁtaṁ

aṁtalaṁ lājāne h!sa hevaṁ ?!?is? ?!?aṁ jane

?aṁ?ava?iyā vā?eya n!?!jane an!l!payā ?aṁ?ava?iyā

va?i?ā ?!taṁ devānaṁpiye piyadasi lājā hevaṁ āhā ?!sa?e

s!?ā atākaṁtaṁ ?a aṁtalaṁ hevaṁ ?!?is? lājāne ?!?a jane

[Resolução dos itens 1 e 2] Temos 12 palavras ainda não decifradas no texto, com duas delas (sublinhadas) aparecendo duas vezes. Devemos relacioná-las com as palavras a se decifrar (etaṁ, pari, nocujane, ca, esame, ichisu, dhaṁmavaḍhiyā), deixando uma dessas palavras "de fora".

Logo no começo, podemos relacionar a primeira e última palavra da terceira linha com dhaṁmavaḍhiyā, tornando possível relacionar as consoantes dh, m e ḍh com suas versões brâmicas. Nessa mesma linha, notamos que a terceira palavra combina com nocujane, o que explica o diacrítico "novo" na letra e torna possível transcrever a consoante c. Com essa mesma consoante, chegamos à conclusão que ca está no texto, e é a terceira palavra da última linha.

Assim, sobram: [etaṁ, pari, esame, ichisu]. A vogal "u" em ichisu também deve ser simbolizada por um diacrítico novo, e esse diacrítico pode ser observado na outra palavra que se repete. Além de apresentar o novo diacrítico como um traço na parte inferior da palavra (que também aparece nos abugidas cingalês e devanagari), percebemos que os "três pontinhos" não são consoantes, mas sim o "i" como vogal silábica.

Sabendo que vogais silábicas podem aparecer (até o momento observado, no começo das palavras), podemos também concluir que o "triângulo" é a letra e, possibilitando uma escrita tanto para etaṁ (segunda palavra da penúltima linha) quanto para esame (última palavra dessa mesma linha).

Assim, sobra a palavra pari, que a arqueóloga anotou erroneamente e, portanto, não está no texto.

[Resolução do item 3]

Basta, agora, transcrevermos essas palavras com base no que sabemos até o momento:

e va ma pi pa ca te su                              dhaṁ mā                                     sa mā di yā mi

[Pós-problema]

Recomendamos alguns artigos para que você aprenda mais sobre questões relacionadas ao problema.

Para saber mais sobre a escrita brâmi, acesse a página informativa de brâmi da Unicode (em inglês).

Para saber mais sobre abugidas e sistemas de escritas em geral, acesse nosso Curso de Linguística (materiais sobre sistemas de escrita em breve!!!).

AVANÇADO

Primeiramente, temos na coluna das traduções uma miscelânea de substantivos e verbos sem muitas relações semânticas semelhantes, além da coluna não conter nenhum espaço em branco para que façamos a tradução  - assim, o problema provavelmente trata apenas de fenômenos fonéticos. É importante fazer essa análise para traçarmos caminhos iniciais, mas se empacarmos durante a solução e sugir a necessidade de observar com mais atenção a coluna das traduções, voltamos para ela!

É evidente que o primeiro passo para a formação da negação em Movima é a adição da partícula kas antes da palavra sofrendo a negação. No entanto, outros fenômenos afetam a palavra negada, e para estudá-los separaremos os elementos do corpus em 3 grupos. 

GRUPO 1: -ka’- inserido após primeira sílaba

bi:law kas bika’law
to:mi kas toka’mi
wa:kato:da kas waka’kato:da

Aqui, percebemos que quando há uma vogal longa na primeira sílaba, para formar a negação apenas é inserido o infixo -ka’- após essa vogal longa, que passa a ser curta. 

GRUPO 2: -a’- inserido após primeira sílaba

delto:veń kas dela’to:veń
vuskwa kas vusa’kwa

Aqui acontece algo semelhante ao observado no grupo 1, com a diferença de que a primeira sílaba deve ser fechada (terminada em consoante) e o infixo utilizado é o -a’-. Entretanto, o elemento abaixo pode gerar confusão: 

bakwanyiń kas bakwana’yiń

Ao fazermos a separação silábica de bakwanyiń como bak-wan-yiń, é de se esperar que a forma negativa seja kas baka’wanyiń de acordo com a regra do grupo 2, o que não ocorre. Será essa uma exceção, ou será que a nossa análise do grupo 2 está incorreta? Na verdade, ao olharmos para a primeira pergunta (a respeito da combinação de duas consoantes que formam um só som), entendemos que essa combinação deve então ser kw, de forma que a separação silábica correta da palavra em Movima é ba-kwan-yiń - dessa forma, o elemento realmente não se encaixa no grupo 2 por não possuir a primeira sílaba fechada. 

GRUPO 3: -(k)a’- inserido após a segunda sílaba em palavras com 3+ sílabas

Podemos também separar essa situação em 2 grupos, analisando de forma separada a adição dos infixos -ka’- e -a’- após a segunda sílaba. No entanto, observamos pelos grupos 1 e 2 que o comportamento dos infixos é semelhante, e aqui podemos confirmar que esse padrão se repete:

maropa kas maroka’pa
lopa:vos kas lopaka’vos
bakwanyiń kas bakwana’yiń
talumno kas taluma’no

Dessa forma, temos que se a primeira sílaba não é fechada ou terminada em vogal longa, o infixo -(k)a’- será adicionado após a segunda sílaba, com -ka’- após sílabas abertas (independemente da duração da vogal anterior) e -a’- após sílabas fechadas. 

GRUPO 4: formas negativas terminadas em -(k)a:Ca’

Finalmente, temos no último grupo os seguintes elementos cuja forma negativa termina em -(k)a:Ca’, em que C é uma consoante: 

joy kas joya:ya’
ełan kas ełana:na’
jiwa kas jiwaka:ka’
en kas ena:na’

Percebemos que, pelas regras estabelecidas anteriormente, o infixo de negação deve ser adicionado no final dessas palavras, algo que não aconteceu nas outras análises - isso explica a razão desses elementos conterem uma formação de negação um pouco diferente. Assim, temos que quando a palavra é monossilábica ou dissilábica sem uma primeira sílaba fechada ou com vogal aberta, na negação adiciona-se ao final -(k)a:- (a depender do caráter aberto ou fechado da sílaba anterior) + -Ca’, em que C é a repetição da consoante anterior. 

Podemos então elaborar as seguintes regras de construção da negação em Movima: 

  1. Adição da partícula kas antes da palavra;
  2. Infixo -(k)a’- adicionado após a primeira sílaba quando esta é fechada ou terminada em vogal longa; caso contrário, o infixo -(k)a’- é adicionado após a segunda sílaba;
  3. A respeito do infixo -(k)a’-, adiciona-se -ka’- após sílabas abertas (tornando a vogal anterior curta se necessário) e -a’- após sílabas fechadas;
  4. Caso a marcação de negação tenha que ser adicionada no final da palavra de acordo com a regra 1, adiciona-se o sufixo -(k)a:Ca’, em que C é a repetição da consoante anterior. 

RESPOSTAS

1. A combinação de consoantes é kw.

2.

as kas asa:sa’ sentar
enferme:ra kas ena’ferme:ra enfermeira
jiła:pa kas jiłaka’pa ralar mandioca
de kas deka:ka’ mentir
rulrul kas rula’rul onça
tipoysu:da kas tipoy’su:da vestido em tipoy
wurul kas wurula:la’ rugir
dewajna kas dewaja’na ver
de:wajna kas deka’wajna ver rastros