Por: Luiz Viegas.
Até então, vimos como os sistemas eletroquímicos podem ser utilizados em sistemas espontâneos como geradores de energia, através de uma energia livre negativa, ou uma, uma diferença de potencial positiva. Veremos, agora, portanto, o caso contrário de célula, na qual o sistema encontra-se necessitado de energia externa para ocorrer a reação de oxirredução.
Eletrólise
Contrariamente ao sistema visto anteriormente de pilhas, ou células galvânicas, a eletrólise – nome advindo da junção de eletro com lise, ou seja, “quebra pela passagem de elétrons” – utiliza a energia elétrica vinda de outro sistema gerador para realizar uma reação de oxirredução específica. Esta, que necessariamente não é favorecida termodinamicamente. Note que é possível de realizar um sistema conjunto de eletrólise com pilha para que um gere a outra, entretanto as aplicações não são tão favoráveis, uma vez que, como será visto, a corrente passada pela eletrólise deve ser constante, ou seja, a pilha teria de ser mantida em estado padrão, ou a resistência de conversão deveria possuir um valor de resistência como uma função do tempo – do caminho reacional da pilha.
A descrição de uma eletrólise, portanto, encontra seu início em observarmos situações nas quais não há o favorecimento a partir da energia livre, isto é, quando ela é positiva. De algumas relações mostradas anteriormente, pode-se concluir que o sinal da diferença de potencial das semi-reações de cada variação de NOx é o oposto do sinal do . Portanto, podemos concluir que aqueles sistemas que possuem um podem ser tratados através de uma eletrólise. O entendimento da utilização de um processo como esse, portanto, é direto quando se obtém a noção de que a energia dada pelo gerador em um sistema desse é apenas para que a reação inversa de uma pilha possa ocorrer. No caso da Célula de Daniell, uma eletrólise sobre o sistema resultaria na redução do zinco e na oxidação do cobre, que é o exato contrário do encontrado no sistema espontâneo. Vamos analisar, portanto, os dois tipos possíveis de eletrólises: ígnea e aquosa.
Eletrólise ígnea
A primeira situação de eletrólise que vamos observar é a montagem mais simples, didaticamente, de analisar o sistema não espontâneo. Para isso, observemos a eletrólise ígnea do cloreto de sódio, que pode ser mostrada pela reação a seguir:
Como o nome já explicita, uma das etapas da eletrólise ígnea é o aumento de temperatura – o nome ignição que deriva a expressão “ígnea” –, que é empregado como a forma de transformar o cloreto de sódio, originalmente sólido, em um meio eletrolítico. A reação ocorrida, portanto, é a seguinte:
A partir deste momento do curso, será utilizado em qualquer reação (ou semi-reação) os descritivos de agregação, ou seja, a descrição do estado físico da espécie. Vemos, portanto, pela reação anterior, como a primeira etapa da eletrólise ígnea realiza um uma quebra da estrutura cristalina do sal, fazendo com que os íons estejam livres pelo meio. Essa etapa, portanto, é necessária apenas para permitir que a corrente elétrica tenha um meio para se propagar – gerando o tão falado meio de íons livres –, o meio líquido. Perceba, ainda, que justamente por se tratar da fusão de um sólido iônico, a temperatura requerida para este processo é muito alta, o que faz com que essa etapa seja a “limitante” da utilização comercial de uma eletrólise ígnea.
Agora, com o sistema já permissivo à passagem eletrônica, os eletrodos são inseridos à cuba na qual se realizou a fusão. Veja, entretanto, que os eletrodos necessários para tal ocorrência reacional não são como em uma pilha, isto é, eles não são aqueles que geram a diferença de potencial. Por esse motivo, a eletrólise, nesse caso, não funcionará com eletrodos de sódio e cloro, e sim eletrodos inertes. Essencialmente, não existe nenhuma espécie química inerte, entretanto algumas dependem de potenciais muito maiores do que outras para ocorrerem em reações redox – como pode ser visto pela análise do Diagrama de Frost de muitos elementos. Por conta disso, diz-se que é utilizado um eletrodo de metal altamente nobre, como a platina. Ainda, pode ser utilizado um eletrodo de grafite, uma vez que este também apresenta uma grande resistência a processos redox – pela sua complexidade estrutural e propriedades específicas dadas à cadeia carbônica que o compõem. Temos, portanto, um sistema composto de dois eletrodos inertes inseridos à cuba que possui os íons em estado líquido, enquanto uma bateria é ligada aos dois eletrodos, de forma a gerar a diferença de potencial necessária à ocorrência da reação.
Ao observar a tabela inserida na aula 2, observamos que o potencial padrão de redução do sódio é , enquanto o do cloro é . Veja, portanto, que o espontâneo seria a oxidação do sódio e a redução do cloro, entretanto a eletrólise ocorre com a utilização de uma fonte externa, portanto a reação é forçada no sentido não espontâneo, isto é, a bateria externa realiza um trabalho não expansivo que não apenas compensa a tendência da oxidação do sódio e redução do cloro, como faz com que o cloro seja oxidado e o sódio reduzido. Conseguimos, portanto, observar que as seguintes semi-reações ocorrem:
Como visto pelas reações acima, o sódio passa por uma redução, o que nos leva à conclusão de que tal reação ocorre ao tempo que os íons de sódio encostam-se no cátodo. Já o cloro passa por uma oxidação, o que nos leva à conclusão de que tal reação ocorre quando os íons cloreto encostam-se no anodo. Observe, portanto, que algumas evidências visuais para a ocorrência da reação são tanto a liberação de gás no anodo, quanto a formação e deposição de metal no cátodo. Atenção ao fato de que tanto o metal depositado quanto o gás liberado não são oriundos do próprio eletrodo – já que este é inerte –, eles são oriundos dos íons que compunham o ambiente químico da eletrólise.
Eletrólise aquosa
A eletrólise não apenas mais cobrada em exames, como também mais utilizada no cotidiano químico, é a eletrólise aquosa. Como o próprio nome explicita, a diferença entre os modos comentados do processo reside no meio eletrolítico que é utilizado à passagem de corrente elétrica: na ígnea é a partir da fusão do sal, enquanto a aquosa é com a utilização de água (com eletrólitos). Vamos analisar, ainda, a eletrólise do cloreto de sódio, mas dessa vez em uma eletrólise aquosa. Montemos o raciocínio antes de observar a reação encontrada pela eletrólise.
Perceba que o cloreto de sódio é altamente solúvel em meio aquoso, portanto o sal forma o próprio meio eletrolítico que permitirá a passagem de corrente elétrica. Observemos, entretanto, quais são os íons que compõem o meio aquoso, ou seja, quais espécies que podem interagir com a passagem de corrente elétrica. É evidente que ocorre uma reação de dissociação iônica do cloreto de sódio, através da qual são liberados os íons e :
Perceba que a reação ocorrida de dissociação do cloreto de sódio com a água é na verdade uma reação que libera os íons nas formas de hidróxido de sódio e ácido clorídrico, portanto devemos considerar também o equilíbrio de autoionização da água, que é mostrado no seguinte:
Utilizaremos no lugar de como uma forma de facilitar a visualização e a escrita das semi-reações. Podemos concluir, portanto, que o meio aquoso no qual ocorre a eletrólise não é formado apenas de íons que interessem ao processo de fato – como é o caso da eletrólise ígnea –, mas também íons advindos da água como competidores. Por conta disso, é utilizada para a eletrólise aquosa uma sequência de descarga favorecida, tanto para a redução como para a oxidação.
- Oxidação: O comum da eletrólise é que a oxidação ocorra com aqueles íons de carga negativa, como o cloreto no caso do NaCl. Por conta disso, a sequência utilizada será com respeito a espécies aniônicas em um geral. Utiliza-se, então, a seguinte:
Veja, portanto, que em um ambiente não básico, há um balanço de íons hidrônio com hidróxido. Por conta disso, a comparação deve ser apenas do íon cloreto com a oxidação da água em si. Caso o sistema fosse básico, como a eletrólise do NaOH, a água seria substituída pelo na sequência.
Analisemos, portanto, o caso no qual há a oxidação do íon hidróxido:
Veja, portanto, que há a oxidação do íon, com a variação do NOx do oxigênio de -2 para 0 na formação de . Agora, para imaginar a oxidação da água, devemos notar que a variação do NOx ainda residirá no oxigênio da mesma forma, portanto será novamente formado o gás oxigênio. Entretanto, pela presença de mais um hidrogênio na água (em comparação ao hidróxido), um dos produtos será o íon , não a água. Da seguinte forma, portanto:
- Redução: O comum da eletrólise é que a redução ocorra com aqueles íons de carga positiva, como o sódio no caso do NaCl. Por conta disso, a sequência utilizada será baseada nos metais e a preferência de descarga em comparação com a água. Note, assim como na oxidação, que um sistema com excesso de ácido, ou seja, uma maior presença de íons , a redução faz-se-á pelo íon, não pela água. Dá-se, então, da seguinte forma:
Observe, portanto, que a redução do metal apenas não se dará preferível quando este metal é ou alcalino, ou alcalino terroso ou o alumínio. Em todos os outros casos, a descarga será no metal.
Analisemos, portanto, o caso no qual há a redução do íon , no excesso de ácido:
Observe que ocorre a redução do íon com o NOx do hidrogênio variando de +1 para 0 com a formação de gás hidrogênio. Analogamente à oxidação da água, a redução dela também ocorre mantendo o mesmo átomo da redução do íon, ou seja, quem reduzirá na redução da água também é o hidrogênio. Dá-se, portanto, da seguinte forma:
Veja, portanto, que independentemente de qual das duas reações que ocorre no cátodo, a liberação de gás hidrogênio sempre ocorrerá quando a eletrólise for de uma espécie que possui metais 1A, 1A ou alumínio.
Voltando à eletrólise do cloreto de sódio, vamos agora analisar quais reações redox que de fato ocorrem no sistema. Perceba o ácido formado a partir do cloreto e o hidróxido de sódio são fortes, portanto há um equilíbrio no pH da solução. Por conta disso, são desprezíveis as quantidades de espécies como e , sendo a reação de redução e oxidação da água que deverão ser comparadas com a de redução de sódio e oxidação do cloreto. É visto, portanto, que a preferência de descarga da oxidação do cloreto é maior do que a da água, o que faz com que a semi-reação anódica seja a seguinte:
A reação ocorrida no cátodo, por outro lado, é favorecida à água, sendo esta a redução da água. A semi-reação catódica, portanto, é a seguinte:
Veja que o sódio não é envolvido em nenhuma etapa de oxirredução, portanto na reação global ele se faz como íon espectador. Por conta disso, ao somar as duas reações supra mostradas, chegamos à seguinte reação global de eletrólise:
Ademais, perceba que o cátodo é onde o elétron foi “reagente” da semi-reação, portanto dizemos que este é o eletrodo negativo. Já o anodo, por ter o elétron como “produto”, é o eletrodo positivo.
Observe que, caso a eletrólise fosse feita de um sal como o sulfato de sódio, a reação ocorrida no anodo seria a oxidação da água, fazendo com que a reação global fosse a seguinte:
Veja que na reação acima a água é tanto a espécie que reduz como a que oxida, portanto diz-se que esta é a reação de eletrólise da água.
Conclusão
Além de ter sido visto como um sistema de eletrólise diferencia-se de uma célula como a de Daniell, foi diferenciado os dois sistemas mais comuns de eletrólise, tanto a ígnea como a aquosa. Mais a frente, veremos uma aplicação e característica de sistemas de eletrólise, que a chamada Lei de Faraday.