Aula 6 - Equação de Nernst

Por: Luiz Viegas

A discussão eletroquímica e a termodinâmica foram separadas até o momento em seções diferentes do curso, entretanto, a partir da presente aula, a abordagem baseada em energia livre e variáveis termodinâmicas será a mais frequente e útil no estudo das noções químicas de processos redox. Será visto, portanto, como o potencial padrão é uma função de equilíbrios em uma célula redox, assim como aplicações disso ao cotidiano químico. Por conta disso, será necessária uma noção de energia livre e algumas relações desta com temperatura e coeficientes reacionais (equilíbrios). 

Equação de Nernst

Quando se estudam as variáveis termodinâmicas presentes e influentes a um processo redox, um dos primeiros pontos de partida é a chamada Equação de Nernst. Como vimos na determinação de potenciais padrão, a condição analisada é exclusivamente a de 1M e 1bar, coisa que não é constante no decorrer de uma célula eletroquímica, portanto o potencial da pilha não se faz nulo em uma descrição de E(t)/dt, ou seja, o potencial da pilha é uma função do caminho reacional do sistema. Para a medição e o estudo dessa variação, portanto, entra o objetivo da equação de Nernst, apoiada à termodinâmica para quantizar a variação. 

Para comprovar a equação de Nernst, voltemos a alguns conceitos termodinâmicos: 

\Delta G^\circ = -n\cdot F\cdot E^\circ

\Delta G = -n\cdot F\cdot E

\Delta G = \Delta G^\circ + RTlnQ

A equação de nernst, após a memorização das supracitadas expressões, faz-se como um facilitador e organizador que agiliza a análise dos sistemas em questão. Constroi-se, portanto, da seguinte forma:

E^\circ = -\frac{\Delta G^\circ}{nF} \rightarrow E^\circ = - \frac{\Delta G - RTlnQ}{nF}

\leftrightarrow E^\circ = \frac{nFE + RTlnQ}{nF} \rightarrow E^\circ = E + \frac{RTlnQ}{nF} \rightarrow E = E^\circ - \frac{RTlnQ}{nF}

Observe, portanto, como a expressão final de Nernst coloca a variação de potencial em qualquer ponto da reação como uma variável dependente de fatores termodinâmicos do sistema como R, T e F^{-1}, assim como fatores termodinâmicos do andamento da reação, como n^{-1} e Q (que é o equivalente à constante de equilíbrio, só que para quaisquer pontos da reação, não apenas o equilíbrio.)

Veja, ainda, que a situação padrão apresenta um Q = 1, que faz com que o fator lnQ seja igual a 0, que zera também a fração \frac{RT}{nF}. Isto, portanto, nos traz à condição de E = E^\circ, ou seja, a condição padrão. 

Note a importância do conhecimento do estado de agregação de cada espécie, uma vez que sólidos não interferem no Q da reação, apenas os íons dissolvidos, portanto não devem ser levados em consideração à conta. Ainda, atente-se às unidades de cada um dos fatores, sendo que os valores mais utilizados das constantes são os seguintes: 

F = 96486 \frac{C}{mol}

R = 8,314 \frac{J}{mol \cdot K}

Condições termodinâmicas

Como todo estudo termodinâmico, é interessante a utilização de todo tipo de conceito que já foi trazido à discussão da eletroquímica, a fim de construir uma noção fundada do sistema presente ao estudo. Verifiquemos, portanto, algumas condições que afetam e modificam o funcionamento de pilhas. 

Como verificado na última aula, sobre a construção de células galvânicas, o potencial padrão da pilha é mantido apenas no instante inicial que ela existe – fato esse confirmado pela equação de Nernst apresentada acima. É notório, portanto, como a simples mudança de concentração de uma das cubas pode alterar completamente o potencial de todo o sistema eletroquímico, o que resulta na possibilidade de utilizar sistemas controlados de variação de concentração para realizar medições e gerar corrente elétrica. 

Pilha de concentração

O potencial de uma célula é uma função de, entre coisas, um quociente reacional que relaciona as atividades dos participantes, que é quase que o sinônimo de dizer relaciona as concentrações dos participantes dissolvidos ao meio eletrolítico. Por conta disso, uma possível construção eletroquímica é a de uma pilha de concentração, isto é, uma célula eletrolítica motivada não pela diferença entre duas espécies diferentes, mas a diferença de concentração de uma mesma espécie. Há dois modelos diferentes de pilhas de concentração ditos na química – a diferença de concentração eletrolítica e a diferença do eletrodo – entretanto focaremos aqui na pilha de concentração eletrolítica, que abrange mais exemplos e mais utilizações. 

Para facilitar a visualização, utilizaremos como exemplo uma célula de níquel, na qual há duas cubas eletrolíticas, ambas com eletrodos de níquel inseridos – uma montagem análoga à célula de Daniell. Entretanto, uma das cubas possui uma concentração de 0,1M e a outra uma concentração 0,001M, ambas de Ni^{2+}. Neste caso, é notório que o potencial padrão da pilha é E^\circ = 0V, justamente pelo fato de que se trata da mesma espécie em ambos os lados. Entretanto, ao passo que cada uma das cubas possui uma diferente concentração de íons de níquel, o sistema localiza-se a uma situação na qual o Q não possui mais o valor de 1, o que faz com que seja criada uma diferença de potencial entre o E^\circ e o E.

A termodinâmica, a noção de energia livre, mostra-nos que a tendência de qualquer sistema químico é a diminuição da energia total, portanto a força motriz de tal configuração é o gradiente de concentração, ou seja, a tendência à cuba de 0,1M sofrer uma redução é maior do que a de 0,001M, justamente como um efeito de finalizar a difusão. As tendências, portanto, fazem-se de forma a que o anodo seja a cuba de menor concentração inicial, enquanto a de maior concentração inicial compoem-se como cátodo

Assim como dito à pilha de Daniell, o anodo sofre corrosão, justamente para que os átomos de níquel com NOx igual a 0 possam se oxidar a Ni^{2+}. O cátodo, concomitantemente, sofre uma deposição de níquel metálico, justamente para diminuir a concentração de íons dissolvidos. Perceba, ainda, que, ainda mais do que em um sistema de Daniell, a presença da ponte salina em uma pilha de concentração de eletrólito faz-se como primordial, uma vez que há uma relação iônica direta. Todo o gradiente de concentração, portanto, resulta em uma produção de corrente elétrica do cátodo para o anodo, o que pode ser utilizado como energia – utilização como pilha de fato. 

O andamento da reação, por conseguinte, resulta em uma diferença de potencial de 0,00V, já que a pilha tende ao equilíbrio de concentração no final. Portanto, podemos ver que a situação inicial em números, através da equação de Nernst, dá-se da seguinte forma:

E = E^\circ - \frac{RT}{nF}\cdot ln(\frac{0,001}{0,1}) \rightarrow E = E^\circ - \frac{RT}{nF}\cdot ln(\frac{x}{x}) \rightarrow E = E^\circ

Veja que foi utilizado x para uma melhor compreensão, justamente pelo fato de que não necessariamente a concentração final faz-se como a soma das iniciais dividido por 2, uma vez que há troca de átomos com o eletrodo. Para encontrar tal número final, portanto, deve-se ter contato com alguns dados da célula eletrolítica, como eficiência faradaica e troca atômica no eletrodo. 

pHmetro

A utilização de pilhas de concentração eletrolíticas como a supra demonstrada de níquel faz-se pouco prática à criação de altas diferenças de potencial, justamente por ser uma motivação pautada em difusão de íons. Por conta disso, é de grande relevância a noção de um exemplo de grande utilização de um sistema desses, que é a utilização pautada no conhecimento de concentração iônica como um medidor de pH – um pHmetro. 

Um sistema de pHmetro é simplesmente a associação de um eletrodo com um sistema de resistência variável, ou seja, um sistema possível de ser utilizado para medição de potencial. Observe que, a partir de um sistema de tal montagem, o sistema eletrônico associado apenas mede o potencial entre as duas entradas (ao ligar o eletrodo à solução problema) e converte tal ddp em um valor de concentração molar de íons hidrônio, através de uma solução padrão de referência acoplada ao sistema. Verifica-se, portanto, através da equação de Nernst, como a diferença de potencial relaciona-se à concentração encontrada pelo sistema, que a converte em um valor na escala de pH. 

Observe no exemplo que o eletrodo que será inserido à solução é aquele que não é protegido e não se apresenta como uma referência à medição, entretanto ambos encontram-se associados por um fio ao sistema de medição. Note, ainda, que o funcionamento é sempre pautado a uma comparação com algum outro sistema, uma vez que potenciais eletroquímicos sempre necessitam de um referencial para serem determinados. 

Conclusão

Através da aula, foi vista a demonstração da equação de Nernst, além de algumas funcionalidades que ela possui para tratarmos de situações eletroquímicas no cotidiano da química. Ainda, foram estudadas as pilhas de concentração e os pHmetros. Mais a frente no decorrer do curso, o foco do estudo será deslocado de uma situação de espontaneidade à produção energética para um foco ao sistema de eletrólise e sua utilização no cotidiano.