Aula 1.6 - Energia, Trabalho e Potência

Escrita por Rafael Ribeiro - Revisado por Akira Ito

É impossível superestimar a importância das leis de conservação no estudo da física, pois estas impõem certas restrições ao comportamento dos corpos sujeitos a essas leis. Juntando quantidades conservadas suficientes, poderemos prever com exatidão a disposição final de um sistema. Em tese, poderíamos resolver todos os nossos problemas com base nas Leis de Newton, mas a conservação de energia (e momento, que é o assunto da próxima aula) se mostra muito mais prática na resolução de vários problemas. Sendo assim, vamos para mais uma sessão do nosso Curso de Física!

Energia

Recordando a fórmula de Torricelli:

v^{2} = v_{0}^{2} + 2a \Delta x \Rightarrow a = \dfrac{1}{2} \dfrac{(v^{2} - v_{0}^{2})}{\Delta x},

onde \Delta x representa um deslocamento ao longo de uma trajetória arbitrária. Usando isso na 2ª Lei de Newton:

F = ma = m \dfrac{1}{2} \dfrac{(v^{2} - v_{0}^{2})}{\Delta x} \Rightarrow F \Delta x = \dfrac{1}{2} m (v^{2} - v_{0}^{2})

Definindo o lado esquerdo da equação como sendo o trabalho feito sobre o sistema (W, do inglês Work) e a expressão \dfrac{1}{2}mv^2 como a energia cinética (E_{c}), temos:

\boxed{W = \Delta E_{c}}

Essa demonstração parece valer apenas para corpos sujeitos a aceleração uniforme, uma vez que faz uso da equação de Torricelli. No entanto, essa equação é válida no estudo instantâneo de qualquer movimento, pois podemos considerar a aceleração instantânea como constante por um curto período de tempo \Delta t, tornando essa fórmula geral.

No SI, a unidade usual de energia é kg \ m^2 \ s^{-2}, conhecida como Joule (simbolizada pela letra J).

Trabalho e Energia Potencial

A definição de trabalho que demos até agora é um tanto quanto incompleta. Um objeto se movendo num plano inclinado, por exemplo, sente a força Normal do piso. No entanto, sabemos que essa força não atua na direção do movimento e não pode ser responsável por aumentar a energia cinética do objeto. Concluímos então que a direção relativa entre força e deslocamento também importa no cálculo do trabalho.

Figura 1: Produto Escalar

Na figura acima, \vec{F} representa uma força agindo sobre o corpo em estudo e \vec{S} representa o vetor posição (isto é, um vetor com que aponta para a posição instantânea do corpo). Assim, \Delta \vec{S} é a variação na posição do objeto. Sabemos que W = F \Delta S para \theta = 0 e W = 0 para \theta = \dfrac{\pi}{2}. Podemos então inferir que o W obedece a seguinte relação:

\boxed {W = \vec{F} \cdot \Delta \vec{S} = F \Delta S \cos \theta}

Deste modo, forças que agem ao longo da trajetória são as que realizam trabalho, enquanto forças perpendiculares a ela não o fazem.

A expressão W = \Delta E_{c} é conhecida como o Teorema da Energia Cinética, e pode ser aplicado para qualquer sistema mecânico. O somatório dos trabalhos realizados sobre um corpo são responsáveis por uma mudança de energia cinética. Vamos ver um exemplo de aplicação dessa ferramenta:

Exemplo: a Figura mostra uma caixa de massa m = 5\,\textrm{kg}  sobre um solo horizontal, partindo do repouso no ponto A sob ação das forças constantes F_1 =40\,\textrm{N} e F_2=10\,\textrm{N}  que agem que agem sobre a caixa até passar pelo ponto C. Apenas no trecho BC existe atrito, de intensidade F_{at} = 5\,\textrm{N}. Determine:

a) O trabalho de cada uma das forças F_1, F_2, F_{at}, normal e peso ao longo do percurso até o ponto C.

b) A velocidade do bloco ao passar pelo ponto C.

c) A força de atrito do segmento BC necessária para chegar com velocidade nula no ponto C.

Solução:

a) A seguir, calcularemos o trabalho realizado por cada força constante, em todo o trecho AC, lembrando de atribuir o respectivo sinal algébrico:

 T_{F1}=+F_1\cos{60^\circ}D=+40\cdot\dfrac{1}{2}\cdot 10=+200\,\textrm{J}

O trabalho de F_1 é positivo pelo fato de esta força estar agindo a favor do deslocamento da caixa. O valor desse trabalho realizado, fisicamente, significa que a força F_1 "deu” (transferiu) 200\,\textrm{J} de energia cinética para essa caixa nesse deslocamento.

 T_{F2}=-F_2 D=-10\cdot 10 = - 100\,\textrm{J}

O trabalho de F_2 é negativo pelo fato de esta força estar agindo contra o deslocamento da caixa. O valor desse trabalho realizado, fisicamente, significa que a força F_2 “tirou” 100\,\textrm{J} de energia cinética desta caixa nesse deslocamento.

 T_P=T_N=0\,\textrm{J}

O trabalho do peso P e da normal N é nulo nesse episódio, pelo fato de estas forças estarem agindo perpendicularmente ao deslocamento D da caixa. O valor desse trabalho realizado, fisicamente, significa que estas forças "não deram nem retiraram” energia cinética dessa caixa nesse deslocamento.

 T_{Fat AC}=T_{Fat AB} + T_{Fat BC}=0+(-F_{at}\cdot d) =-5\cdot (2)=-10\,\textrm{J}

A força de atrito não realiza trabalho no trecho AB por ter uma intensidade nula naquele trecho. No trecho BC, o Fat cinético age contrário ao deslocamento d da caixa e, portanto, realiza trabalho negativo. No computo geral, a força de atrito, em todo o percurso AC, “retirou" 10 \,\textrm{J} de energia cinética da caixa, transferindo para o solo na forma de energia térmica.

 

b) Para encontrar a velocidade, basta usar o teorema da energia cinética:

 \Sigma T=\Delta E_{cin}

 T_1+T_2+T_P+T_N+T_{Fat}=\frac{1}{2}mv^2 - \frac{1}{2}mv_0^2

 200 -100 -10=\frac{1}{2}\cdot 5 \cdot v^2

 90=\frac{1}{2}\cdot 5 \cdot v^2

 v=6\,\textrm{m/s}

Note como como esse processo não leva em consideração os processos intermediários do sistema. Não foi preciso calcular a aceleração e velocidade em todos os instantes intermediários. Com o uso dos conceitos de energia e trabalho, conseguimos calcular apenas a velocidade que nos interessa! Experimente fazer esse problema calculando as forças resultantes em cada segmento, depois encontrando as acelerações resultantes e, depois de utilizar as equações horárias da velocidade e posição, você encontrará o mesmo valor de v, mas com certeza será um processo muito mais trabalhoso.

Outra vantagem de usar o conceito de trabalho é que não precisamos de nenhuma informação de tempo. Isso se torna muito útil em diversos problemas em que a situação não é tão simples como o exemplo que foi mostrado.

c) Para que o bloco chegue no ponto C com velocidade nula, o trabalho da força de atrito deve cancelar o trabalho das forças 1 e 2. Dessa forma, o somatório dos trabalhos será zero e a variação de energia cinética (e, portanto, a velocidade) será nula. Portanto:

 \Sigma T = \Delta E_{cin}

 T_1+T_2+T_{Fat}=0

 T_{Fat}= -100\,\textrm{J}

Usando a definição de trabalho e o deslocamento do bloco no trecho BC:

 F_{at}\cdot 2=-100

 F_{at}=-50\,\textrm{N}

Ou seja, a força de atrito deve possuir 50\,\textrm{N} em módulo e deve apontar no sentido contrário ao deslocamento do bloco para que ele possua velocidade nula ao passar pelo ponto C.

Condições para que haja realização de trabalho

Um erro muito comum é associar a grandeza trabalho com o termo "Esforço". Isso gera alguns erros conceituais na cabeça do aluno, então para garantir que você saia dessa aula com um entendimento inuitivo sobre o que é trabalho, vamos ver alguns exemplos:

Exemplo 1: Lucas Tavares vai à academia algumas vezes na semana e uma das atividades que ele realiza durante o treino consiste em segurar dois halteres com as mãos, levantá-los e ficar segurando eles no ar por alguns segundos.

Nesse exemplo,  Tavares realiza trabalho ao levantar os halteres pois ele exerce uma força vertical enquanto os pesos se movem para cima. No entanto, ao ficar segurando os halteres no ar, sem se mover, ele não realiza trabalho pois não há deslocamento. Certamente Lucas precisa de um esforço para mantê-los no ar e ele gasta a energia que ele obteve por meio de sua alimentação, no entanto, ele não realiza trabalho sobre os halteres nessa etapa.

Exemplo 2: Depois que Lucas termina sua atividade física, ele carrega os pesos enquanto caminha com velocidade constante para guardá-los no lugar apropriado.

Nesse exemplo, por mais que exista uma força sendo exercida por Lucas e também haja um deslocamento, ele ainda não realiza trabalho sobre os halteres pois o deslocamento é perpendicular à força. Como \cos90^\circ=0, então não há trabalho sendo realizado. Porém, se Lucas estivesse caminhando aceleradamente, ele estaria realizando trabalho.

Exemplo 3: Imagine agora a clássica situação de um pêndulo simples. A velocidade do pêndulo oscila periodicamente graças ao trabalho realizado por uma força externa.

Nesse exemplo, note como a massinha se move ao longo de uma circunferência. A tração sempre aponta na direção radial, de forma que ela sempre é perpendicular à direção da velocidade, conforme mostra a imagem abaixo.

Assim, podemos concluir que a tração não realiza trabalho, a força responsável por variar a velocidade da massinha é o peso.

Trabalho de forças importantes

Consideremos agora algumas forças particulares para determinar o trabalho realizado por elas:

Peso

Figura 2: Campo gravitacional na superfície da Terra

Nas proximidades da Terra, a força peso é aproximadamente constante e dada por:

\vec{F} = -mg \hat{y} \Rightarrow \vec{F} \cdot \Delta \vec{S} = W = -mg \hat{y} \cdot \Delta \vec{S}

O produto escalar da direita pode ser expandido como:

 \hat{y} \cdot \Delta \vec{S} = \hat{y} \cdot (\Delta x \hat{x} + \Delta y \hat{y} + \Delta z \hat{z}) = 0 + \Delta y + 0

\Rightarrow \hat{y} \cdot \Delta \vec{S} = \Delta y

Desse modo:

\boxed {W = -mg \Delta y}

Logo, pelo Teorema do Trabalho:

-mg\Delta y = \Delta E_{c} \Rightarrow \Delta E_{c} + mg\Delta y = 0 \Rightarrow E_{c} + mgy = \text{constante}

Podemos dizer que o termo mgy corresponde a uma forma de energia "potencial" que depende puramente da altura do objeto e que se transforma em energia cinética a medida que o corpo cai. No geral, energias potenciais são representadas pelo símbolo U:

\boxed{U = mgy} \Rightarrow E_{c} + U = \text{constante}

Reconhecendo E_{c} + U como sendo a energia mecânica total do corpo em estudo, podemos afirmar que a energia mecânica do corpo é conservada! Note que para corpos extensos, devemos tomar a altura do centro de massa como referência para calcular a sua energia potencial. Além disso, perceba que a Energia Potencial é determinada em relação a um determinado ponto de referência, para o qual assinalamos a altura y_{0} = 0 e a energia U_{0} = 0. Podemos escolher esse y_{0} livremente, uma vez que apenas as variações de Energia Potencial importam.

Outra forma de demonstrar o trabalho da força peso é a partir de um gráfico de Força x Deslocamento:

Figura 3: Gráfico do Peso por Altura

A área entre o gráfico e o eixo das abscissas (incluindo o sinal negativo, pois a função está abaixo do eixo) nos dá o trabalho da força peso, e o negativo dessa quantidade nos dá a variação de energia potencial:

W = A_{\text{graph}} =- mg \times \Delta y \Rightarrow \Delta U = mg \Delta y

O uso desse segundo método pode ser generalizado, evidentemente, para o trabalho de qualquer força: conhecendo-se a dependência da força F com a posição y F=F(y), podemos obter o trabalho realizado pela força calculando a área embaixo do gráfico F x y dentro do intervalo desejado.

Esse fato será crucial para demonstrar o próximo resultado.

Força elástica

Nesse caso, a expressão da força é dada por:

\vec{F} = - k(x - l_{0}) \hat{x},

onde k representa a constante da mola, x o seu comprimento e l_{0} o seu comprimento natural, como fica exemplificado pela figura abaixo:

Figura 4: Força elástica

Graficamente, essa força equivale a:

Figura 5: Gráfico da Força Elástica pelo Deslocamento

Pelo gráfico, a área estudada corresponde a um triângulo de superfície dada por:

A_{\text{graph}} = - \dfrac{1}{2} \Delta x \times k(x - l_{0}) = - \dfrac{1}{2} k (x - l_{0})^2 = W

Com isso, concluímos que:

\boxed{U = \dfrac{1}{2} k (x - l_{0})^2}

Note que para a Energia Potencial Elástica, escolhemos o ponto de referência como sendo x_{0} = l_{0}, o comprimento natural da mola.

Força gravitacional

A força gravitacional entre dois corpos de massa m e M e separados por uma distância r é dada por:

\vec{F} = - \dfrac{GMm}{r^2} \hat{r}

Figura 6: Atração gravitacional entre dois corpos

Como essa força é puramente radial, o trabalho feito para se realizar um pequeno deslocamento \Delta \vec{S} é:

W = \vec{F} \cdot \Delta \vec{S} = |\vec{F}| \hat{r} \cdot (\Delta r \ \hat{r}) = |\vec{F}| \Delta r

Sendo assim, tomemos um pequeno deslocamento radial \Delta r, saindo de r para r' = r + \Delta r. Podemos considerar a força gravitacional nesse período como constante e de módulo dado pela média entre as forças em r e r':

F = \dfrac{1}{2}(F_{r} + f_{r + \Delta r}) = -\dfrac{mMG}{2r^{2}} (1 +(1 + \dfrac{\Delta r}{r})^{-2})

A expansão binomial nos diz que (1 + x)^{n} \approx 1 + nx para x << 1. Com isso:

F = - \dfrac{mMG}{2r^{2}} (1 + 1 - 2 \dfrac{\Delta r}{r}) = - \dfrac{mMG}{r^{2}} (1 - \dfrac{\Delta r}{r}) = - \dfrac{mMG}{r^{2} (1 + \dfrac{\Delta r}{r})} = - \dfrac{mMG}{rr'}

Com essa expressão para a força, podemos calcular o trabalho realizado no movimento:

W_{r \rightarrow r'} = F (r' - r) = -mMG (\dfrac{1}{r} - \dfrac{1}{r'})

E se seguirmos de r' para r''? Devemos somar as duas contribuições:

W_{r \rightarrow r''} = -mMG (\dfrac{1}{r} - \dfrac{1}{r'}) - mMG (\dfrac{1}{r'} - \dfrac{1}{r''}) = -mMG (\dfrac{1}{r} - \dfrac{1}{r''})

Desse modo, concluimos que a expressão geral para W é:

-mMG (\dfrac{1}{r_{0}} - \dfrac{1}{r_{f}}) \Rightarrow \Delta U = mMG (\dfrac{1}{r_{0}} - \dfrac{1}{r_{f}})

Se medirmos essa energia potencial em relação ao infinito (isto é, r_{0} \rightarrow \infty), o primeiro termo some e chegamos na expressão familiar:

\boxed{U = - \dfrac{GMm}{r}}

 

Com tudo isso, podemos partir para uma versão aprimorada do Teorema do Trabalho:

W = \Delta E_{c} + \Delta U

Isso afirma que o Trabalho das forças externas sobre um sistema corresponde à variação de sua energia total, incluindo termos cinéticos, gravitacionais, elásticos, elétricos, ... Além disso, define energia como sendo a capacidade de um sistema de realizar trabalho.

Vejamos um exemplos prático:

Considere um sistema de 3 partículas de massa m localizadas no espaço, dispostas nos vértices de um triângulo equilátero de lado l. Determine o trabalho realizado para desmantelar esse sistema.

A energia inicial do sistema vale U = - 3\times \dfrac{GMm}{l}, uma vez que a energia de cada interação é U = - \dfrac{GMm}{l}. Pelo Teorema do Trabalho:

W = \Delta U = 0 - (-3 \dfrac{GMm}{l}) \Rightarrow \boxed {W = 3\dfrac{GMm}{l}}

Forças dissipativas

Ainda só trabalhamos com forças conservativas, para as quais existe uma energia potencial associada que nos permite dizer que a energia mecânica de um objeto (E_{mec} = E_{c} + U) é constante. No entanto, esse nem sempre é o caso. Certas forças (como o atrito e forças viscosas em fluidos) agem de modo a dissipar essa energia mecânica, transformando-se em energia térmica para o sistema. É usando essa transformação que conseguimos acender fogueiras apenas esfregando (avidamente) pedaços de madeira. Apenas reforçando, a energia mecânica de um sistema se conserva desde que ele não esteja sujeito a forças dissipativas!

Por exemplo, quando jogamos um corpo para deslizar no chão, ele eventualmente cessa seu movimento horizontal. Sabemos que o responsável por isso é o atrito: como ele se opõe ao movimento, seu trabalho é negativo e dado por W = F_{f} \Delta S \cos \pi = - F_{f} \Delta S. Como a energia do universo (que é verdadeiramente um sistema isolado) é constante, a energia retirada do sistema é cedida para o ambiente como energia térmica ou sonora. De forma similar, a resistência do ar ou de um líquido tende a dispersar a energia do sistema. Podemos visualizar isso no próximo exemplo:

Um bloco se movimenta ao longo de um plano inclinado de coeficiente de atrito \mu e ângulo \theta com a horizontal. Determine a aceleração do corpo.

Após se locomover um \Delta S, o corpo sofre um \Delta E_{c} = \dfrac{mv^2}{2} - \dfrac{mv_{0}^2}{2} e \Delta U = - mg \sin \theta \Delta S. Além disso, o atrito realiza um trabalho (negativo!) de valor W = - \mu mg \cos \theta \Delta S. Usando isso e o Teorema do Trabalho, temos:

-\mu mg \cos \theta \Delta S = \dfrac{mv^2}{2} - \dfrac{mv_{0}^2}{2} - mg \sin \theta \Delta S

Organizando essa expressão, obtemos:

V^{2} = V_{0}^{2} + 2 g(\sin \theta - \mu \cos \theta) \Delta S = V_{0}^{2} + 2 a \Delta S,

que é a Fórmula de Torricelli! Com isso, a aceleração do sistema é:

\boxed {a = g(\sin \theta - \mu \cos \theta)}

Observação: A força de atrito nem sempre realiza trabalho negativo!

Embora a força de atrito sempre seja contrária à tendência de deslizamento, ela nem sempre é contrária ao sentido de movimento. Essa frase pode parecer confusa, então vamos entender com um exemplo. Imagine uma prancha comprida em um plano horizontal liso, inicialmente em repouso. Sobre essa prancha há um bloco áspero (de forma que há atrito entre a prancha e o bloco). O bloco então recebe um impulso e passa a se mover com uma velocidade v para a direita.

Inicialmente possuímos o seguinte diagrama de forças (as forças peso e normal foram omitidas para deixar a figura mais limpa).

Note como a força de atrito é contrária ao movimento do bloquinho e favorável ao movimento da prancha para a direita. Depois de algum tempo teremos a situação abaixo:

Ou seja, o atrito e a velocidade (e portanto o deslocamento) apontam para o mesmo sentido. Dessa forma, podemos concluir que o atrito realizou trabalho positivo! O atrito ainda dissipa energia em forma de calor e ele também desacelera o bloquinho, mas ele realiza trabalho positivo sobre a prancha.

Potência

Muitas vezes estamos interessados numa taxa de transmissão de energia. Por exemplo, queremos saber quanto uma geladeira gasta de energia mensalmente, ou quanto tempo leva para que uma boa xícara de café esquente. Para isso trabalhar com esses dados, fazemos uso de uma grandeza chamada "Potência" (e simbolizada por P), definida como:

\boxed {P = \dfrac{\Delta E}{\Delta t}}

Desse modo, a unidade de medida de potência (no SI) é J s^{-1}, conhecido como Watt e representado pelo símbolo W. Outras unidades cotidianas de potência são o cavalo-vapor (1 cv = 735,5 W) e o horse-power (1 hp = 745,7 W)

Em alguns casos, é útil representar a Potência da seguinte forma:

P = \dfrac{\Delta E}{\Delta t} \dfrac{\Delta S}{\Delta S} = \dfrac{\Delta S}{\Delta t} \dfrac{\Delta E}{\Delta S}

Identificando \dfrac{\Delta S}{\Delta t} como a velocidade e simplificando \dfrac{\Delta E}{\Delta S} = \dfrac{F \Delta S}{\Delta S} = F, temos:

\boxed {P = \vec{F} \cdot \vec{v} = Fv \cos \theta}

Considere o seguinte exemplo prático:

Desejamos subir um bloco de massa 40 \text{kg} com velocidade constante de 2 \ \text{m} \ \text{s}^{-1} ao longo de um plano inclinado de \dfrac{\pi}{6} radianos. O corpo tem um coeficiente atrito de 0,5 com o piso, e a gravidade tem módulo de 10 \ \text{m} \ \text{s}^{-2}. Determine a potência em cavalo-vapor do aparelho responsável por puxar o corpo.

Figura 7: Plano Inclinado

Pelo enunciado:

T = mg \sin \theta + F_{f} = mg \sin \theta + \mu mg \cos \theta = mg (\sin \theta + \mu \cos \theta)

Com isso, a Potência da máquina deve ser:

P = \vec{F} \cdot \vec{v} = mgv (\sin \theta + \mu \cos \theta)

Usando os dados do enunciado:

P = 746 \ W

Como cada cavalo-vapor corresponde a 735,5 Watts, obtemos finalmente que:

\boxed {P = 1,01 \ cv}

Note que nós fornecemos uma potência P para o corpo, mas apenas uma parte dessa taxa (conhecida como potência útil, P_{u}) é usada para aumentar a energia dele. A outra componente da potência (conhecida como potência dissipada, P_{d}) é perdida para o ambiente como calor (levando a um aumento de temperatura, assim como quando esfregamos as mãos para aquecer) e como ondas sonoras. Pela conservação da energia do universo, temos:

P = P_{u} + P_{d}

No caso do exemplo dado, temos que P_{u} = mgv \sin \theta (esta é a taxa de energia efetivamente ganha na forma de potencial gravitacional) e P_{d} = mgv \mu \cos \theta (esta é a energia perdida por unidade de tempo devido ao atrito, seja como calor ou como som). Juntas elas resultam na potência total da máquina.

É muito comum que queiramos saber quanto de potência útil nós obtemos para cada unidade de potência fornecida ao sistema. Para isso definimos o rendimento de um sistema como:

\boxed {\eta = \dfrac{P_{u}}{P} = 1 - \dfrac{P_{d}}{P}}

No exemplo anterior, o rendimento é:

\eta = \dfrac{mgv \sin \theta}{mgv (\sin \theta + \mu \cos \theta)} = \dfrac{\sin \theta}{\sin \theta + \mu \cos \theta} \approx 0,536

Essa grandeza possui uma importância profunda na nossa sociedade: estamos sempre buscando produzir o máximo possível a partir do que temos, e para isso devemos reduzir as dissipações e buscar aumentar o rendimento.