Escrito por Felipe Martins
Revisado por Matheus Borges
Nas aulas passadas, construímos a base teórica necessária para o estudo de energia, momento linear e leis de conservação associadas a essas quantidades. Nessa aula faremos a aplicação destes conceitos, estudando as características e propriedades de colisões mecânicas mais profundamente. É importante lembrar que uma colisão é definida quando dois ou mais corpos inicialmente livres (não interagiam entre si) passam a interagir. Por interação, entenda que haverá forças de ação e reação que os corpos exercem entre si. Sendo assim, não é necessário que dois corpos se toquem diretamente para quantificar uma colisão: basta que eles passem a interagir entre si, por intermédio de alguma força, inclusive forças à distância como a força gravitacional! Tendo isso em mente, vamos prosseguir com o nosso curso.
Colisões
Coeficiente de Restituição
O coeficiente de restituição é a relação entre os impulsos de aproximação (ou deformação) e afastamento (ou restituição) nos corpos envolvidos na colisão, ou seja:
Onde o impulso de aproximação é o impulso aplicado nos corpos até o ponto que eles param de se aproximar (velocidade relativa nula) e o impulso de afastamento é o impulso do ponto que eles param de se aproximar até acabar a colisão. Podemos analisar a colisão como dois blocos idênticos de massa e uma mola, já que isso é análogo à deformação que os blocos sofreriam caso colidissem diretamente entre si:
Figura 1: Colisão em etapas
Então
Ou seja
Esse é o formato mais conhecido do coeficiente de restituição e o mais empregado em questões.
Tipos de Colisão
Vamos fazer uma análise da energia antes e depois da colisão
Considerando possíveis dissipações temos
Pela conservação do momento
Então
Portanto, dependendo do valor de classificamos a colisão de diferentes formas:
A colisão é elástica, e esse é o único caso em que podemos conservar a energia cinética.
A colisão é parcialmente elástica.
A colisão é inelástica.
Colisão Unidimensional
É bastante útil conhecer o caso geral para colisões unidimensionais. Mostraremos a colisão entre dois corpos 1 e 2 que possuem velocidades iniciais e , massas e e sua colisão tem coeficiente de restituição "". Assim, temos duas equações e duas variáveis( e )
Figura 2: Colisão de dois blocos
onde as velocidades e são as finais para, respectivamente, o corpo 1 e o corpo 2. Isolando na segunda equação temos:
Substituindo na primeira equação, obtemos:
Colisão entre massas Iguais
Para este caso especial basta colocar as massas como iguais. Temos:
Vale ressaltar que caso a colisão fosse elástica e .
Colisão contra uma Parede
Figura 3: Bloco e parede
Deve-se observar que, como a parede tem uma massa muito maior que a do outro objeto (podemos dizer que a parede tem massa "infinita"), podemos escrever . Assim, temos:
No caso onde a parede está parada no começo obtemos:
Ou seja, a velocidade inverte de sentido e seu módulo depende do coeficiente de restituição.
Figura 4: Bloco voltando
Colisão Elástica
Para a colisão elástica basta colocar o coeficiente de restituição igual a um. Temos neste caso:
Colisão Inelástica
Para a colisão inelástica basta colocar o coeficiente de restituição igual a zero. Temos para este caso:
Parede em movimento
vamos estudar um caso onde um corpo com velocidade colide com uma parede que se desloca com velocidade , considere o coeficiente de restituição da colisão. Qual a velocidade do corpo após a colisão?
Figura 5: Parede em movimento.
Note que a massa da parede é muito maior que a massa do bloco, o que implica que a velocidade da parede praticamente se mantém constante.*
*OBS: A ideia da velocidade se manter constante devido ao fato de uma massa ser bem maior que a outra é bastante comum em problemas de colisões.
Colisão Inclinada contra uma parede
Considere que um corpo colide com uma parede vertical lisa formando um ângulo com a horizontal (veja a figura 6). Se o coeficiente de restituição for , qual o ângulo de saída do corpo?
Figura 6: Colisão inclinada.
Note que como a parede é lisa, só há interação entre o corpo e a parede na horizontal, ou seja, a velocidade vertical permanece constante:
pelo coeficiente de restituição obtemos
Portanto
Vale ressaltar um caso específico extremamente interessante: se a colisão for elástica (), obtemos , i.e. os ângulos de entrada e saída são iguais (semelhante à lei da reflexão da óptica geométrica).
Colisão Elástica Bidimensional
Vamos analisar como montar as equações para o caso da seguinte colisão: um corpo de massa com velocidade colide elasticamente com um corpo de massa inicialmente parado, de tal forma que o desvio (inclinação do vetor velocidade após a colisão em relação à direção da velocidade de antes da colisão) de seja e de seja
Figura 7: Colisão bidimensional
Podemos conservar o momento tanto no eixo tanto no eixo e conservar a energia(colisão elástica), as equações ficam
Massas iguais
Vamos achar uma relação entre os ângulos para o caso :
Resolvendo o sistema
então
analogamente
ou seja,
O que significa que as bolas saem com velocidades perpendiculares entre si.
Vejamos, agora, um exemplo de colisão à distância, através de um problema clássico (que, por sinal, já fora cobrado posteriormente na terceira fase da OBF 2011 na prova do nível 2).
Exemplo (Estilingue gravitacional): Ao enviar sondas e objetos para outros planetas, muitas vezes costuma-se usar uma manobra chamada de estilingue gravitacional, no qual a nave se aproveita da gravidade de um planeta massivo para impulsionar seu movimento sem precisar utilizar um sistema de propulsão e gastar combustível. Considere a figura a seguir, que mostra o planeta Júpiter se movendo com velocidade . A massa de Júpiter é . Uma nave espacial com massa se aproxima de Júpiter com velocidade . A atração gravitacional faz com que a nave mude de direção e retome em sentido oposto. Considerando qual é a velocidade final da nave?
Figura 8: Estilingue gravitacional.
Nessa caso a colisão não é um impacto, mas sim uma interação gravitacional. Vamos considerar que a colisão inicia e termina quando a nave está muito distante do planeta, ou seja, a energia potencial gravitacional é no início e no fim. Pela conservação do momento e da energia chegamos a
Resolvendo o sistema
Perceba que como a velocidade de Júpiter praticamente não muda, logo
Perceba que este exemplo, dadas as aproximações utilizadas, torna-se inteiramente análogo ao exemplo da colisão contra uma parede rígida.