Aula 2.4 - Primeira lei da termodinâmica

Escrita por Antônio Ítalo

A termodinâmica é o ramo da física que vai estudar a transformação de energia térmica em energia mecânica e vice versa. Essa transformação de energias ocorre a partir de vários tipos de processos, mas, antes de estudá-los, devemos primeiro enunciar a primeira lei da termodinâmica e explicar o que a mesma significa. A primeira lei da termodinâmica afirma:

A energia se conserva

Sendo enunciada matematicamente por:

Q=W+\Delta U

Sendo Q o calor trocado com o meio externo, sendo positivo quando está entrando no sistema, W o trabalho realizado pelo sistema nas vizinhanças do mesmo e U a energia interna do nosso sistema.

Sabe-se que d'W=F dx=P_{op} dV. Ou seja, para pequenas variações de volume dV, o trabalho será P_{op} dV

Processos Reversíveis e Irreversíveis 

Pode-se interpretar que um processo reversível é todo processo que pode ser realizado no caminho inverso, tomemos o seguinte exemplo:

Exemplo 1: Expansão livre de um gás ideal

Um mol de um gás ideal está contido em um recipiente de volume V_{0} que possui uma parede o ligando até outro recipiente igual de mesmo volume e vazio. A pressão inicial desse gás é P_{0}. Em um instante, a parede é removida e o gás passa a ocupar um volume 2V_{0}. Esse processo é reversível? Qual o trabalho realizado pelo gás? Qual a variação de energia interna do gás? Qual a nova temperatura do gás?

Solução:

Note que o novo recipiente está vazio, ou seja, não há nada impedindo a expansão do gás:

P_{op}=0 \rightarrow W=0

Sendo que o gás não recebe calor externo, portanto, temos:

\Delta U=0

E, como nosso gás é ideal:

\Delta T=0

Esse processo será irreversível pois o gás não vai voltar a ocupar somente o volume V_{0} sem que um trabalho seja realizado sobre ele, ou seja, ele não pode voltar para o estado inicial por um processo contrário à expansão livre.

Exemplo 2:

Um gás ideal com n mols está à uma temperatura T e possui volume inicial V_{0}, sabendo que o gás terá seu volume aumentado continuamente de maneira lenta (Processo quase-estático) até um volume final V, sendo mantido sempre na mesma temperatura T (Expansão Isotérmica), responda:

a) Esse processo é reversível?

b) Qual o trabalho realizado por esse gás?

c) Qual a variação da energia interna do gás?

d) Qual foi o calor recebido pelo gás?

Solução:

a) Sim, esse processo é reversível. Perceba que pelo processo ser quase-estático em cada instante o gás está em equilíbrio, portanto, podemos, a partir da posição de equilíbrio final, voltar para a anterior ao realizar sobre ele de maneira lenta o mesmo trabalho que realizou no sistema, sempre o mantendo a temperatura constante. Dessa forma, teremos voltado para o estado inicial pelo processo reverso que chegamos no estado final.

b) Essa demonstração irá necessitar de conhecimentos básicos de cálculo, portanto, se não estudou esse assunto, pode ser ignorada à princípio (pelo menos para a OBF), entretanto, é necessário conhecer o resultado final.

Como o processo é quase-estático, podemos escrever:

d' W=p\ dV

Sendo que, pela equação de Clapeyron:

P=\frac{nRT}{V}

Sendo assim:

d' W=nRT\frac{dV}{V}

Integrando:

W=nRT\ln(\frac{V}{V_{0}})

Esse é um resultado muito frequente e é útil de ser memorizado, principalmente caso não tenha os conhecimentos de cálculo para realizar essa demonstração.

Relação de Mayer

Nessa seção, definiremos duas grandezas muito importantes no estudo da termodinâmica e demonstraremos a relação entre elas para um gás ideal.

Capacidade térmica molar à pressão constante (C_{p})

Essa grandeza é definida de forma que, em um processo isobárico, ou seja, em um processo que ocorre a pressão constante, seja a capacidade térmica por mol do sistema. Ou seja:

C_{p}=\frac{1}{n}\frac{\Delta Q}{\Delta T}_{p=cte}

Sendo essa expressão válida caso C_{p} seja constante, que é o mais comum, senão:

C_{p}=\frac{1}{n}\Big(\frac{\partial Q}{\partial T}\Big)_{p}

Essa expressão não chegará a ser usada aqui ou na OBF, mas é interessante entender que ela é simplesmente o limite de quando \Delta T vai à zero aplicado na primeira expressão.

Capacidade térmica molar à volume constante (C_{v})

Essa grandeza é definida de maneira totalmente análoga à C_{p}, entretanto, essa é a capacidade térmica por mol do sistema caso ele esteja realizando uma transformação isocórica (volume constante). Analogamente a C_{p}:

C_{V}=\frac{1}{n}\frac{\Delta Q}{\Delta T}_{V=cte}

Sendo essa expressão válida caso C_{p} seja constante, que é o mais comum, senão:

C_{V}=\frac{1}{n}\Big(\frac{\partial Q}{\partial T}\Big)_{V}

Antes de prosseguirmos para a demonstração da relação de Mayer, devemos mostrar a fórmula para a variação da energia interna de um gás ideal em função do C_{V}. Para realizar essa demonstração, devemos lembrar que para um gás ideal o teorema da equipartição é válido e, portanto, sua energia interna deve ser função somente da temperatura, além de ser uma função de estado. Sendo assim, calculemos a variação da energia interna em um processo isocórico (volume constante), a partir da primeira lei da termodinâmica:

d'Q=d'W+dU

(Escrevemos a primeira lei em formato diferencial para garantir a validade do resultado mesmo com a capacidade térmica variando com a temperatura, por exemplo, mas caso não esteja familiarizado com essa notação diferencial pode-se interpretar d' e d como \Delta, a única diferença real é que estamos olhando para variações muito pequenas, literalmente tão pequenas quanto possível. Gostaria de relembrar que d' é utilizado para se referir a uma quantidade de calor e trabalho infinitesimal, não à variação de algo pois essas grandezas não são funções de estado como a energia interna)

Em um processo isocórico, temos:

d'W=0

E:

d'Q=nC_{V}dT

Sendo assim:

dU=nC_{V}dT

Agora estamos prontos para demonstrar a relação de Mayer.

Demonstração:

Tomemos um processo isobárico (pressão constante) reversível e escrevamos a primeira lei da termodinâmica:

d'Q=dU+d'W

Nesse caso, temos:

d'Q=C_{p}dT

E:

d'W=pdV

Mas, por Clapeyron:

pdV=nRdT

Logo:

nC_{p}dT=nC_{V}dT+nRdT

Logo:

C_{p}-C_{V}=R

Que é a relação de Mayer. Nota-se então que para um gás ideal monoatômico:

C_{V}=\frac{3R}{2}

E:

C_{p}=\frac{5R}{2}

A seguir, finalizaremos a aula com a equação de uma transformação adiabática reversível.

Transformação adiabática reversível de um gás ideal

Ao longo dessa seção será utilizado cálculo, portanto, se não tiver conhecimento do assunto, fique atento somente aos conceitos e ao resultado final.

Uma transformação adiabática é definida como aquela em que não é trocada calor com o ambiente, ou seja, o sistema é termicamente isolado. Podemos então escrever:

 

d'W=-dU

No caso do processo ser reversível:

pdV=-nC_{V}dT

Por Clapeyron:

p=\frac{nRT}{V}

Logo:

\frac{nRT}{V}dV=-nC_{V}dT

R\frac{dV}{V}=-nC_{V}\frac{dT}{T}

Integrando:

Rln\Big(\frac{V}{V_{0}}\Big)=C_{V}ln\Big(\frac{T_{0}}{T}\Big)

\Big(\frac{T_{0}}{T}\Big)^{\frac{C_{V}}{R}}0=\frac{V}{V_{0}}

Definindo o coeficiente de Poisson \gamma=\frac{C_{p}}{C_{V}}, temos:

\frac{C_{V}}{R}=\frac{C_{V}}{C_{p}-C_{V}}=\frac{1}{\gamma-1}

Logo:

TV^{\gamma-1}=T_{0}V_{0}^{\gamma-1}=cte

Por Clapeyron:

pV^{\gamma}=cte

Sendo essa a equação de uma adiabática. Esse resultado na verdade é mais geral sendo válido não apenas para gases ideais, mas para todo gás que obedece uma equação do tipo:

pV=f(T)

Onde f é uma função arbitrária e o gás deve também possuir coeficiente de Poisson constante. Entretanto, a prova desse resultado necessita de um uso ainda mais aprofundado de cálculo, incluindo o uso de derivadas parciais, portanto, não será abordada aqui.