Aula 3.1 - Propagação de Ondas em cordas

Escrita por Antônio Ítalo

Introdução

Ao longo dessa aula estudaremos a propagação de ondas em uma corda. Algumas considerações são importantes para podermos realizar esse estudo:

  • Pequenas amplitudes nas oscilações, ou seja, a metade da diferença de altura entre o ponto mais baixo e o ponto mais alto é muito menor que o comprimento de onda.
  • Como consequência da condição anterior, as inclinações na corda são todas pequenas, de forma que podemos aproximar: \sin \theta \approx \tan \theta \approx \theta.
  • A tração na corda se manterá aproximadamente constante.
  • Ausência de gravidade.
  • Ausência de forças dissipativas como a resistência do ar.

Sabendo disso, podemos afirmar que se propagará em uma corda ondas com velocidade bem definidas (provaremos mais adiante). Essas ondas podem ser classificadas como progressivas devido à essa velocidade bem definida, para entender melhor o que isso significa veja as  figuras abaixo.

 

As figuras acima representam o perfil de uma corda em dois diferentes instantes, digamos que a primeira figura represente a corda em t=0 s, enquanto a segunda figura representa a corda em t=2 s. As escalas presentes na imagem estão em metros. É possível notar que a segunda figura é muito semelhante a primeira, entretanto, ela foi deslocada 2 m para a direita. Nessa corda temos então uma onda progressiva para a direita se propagando com velocidade: V=\dfrac{\Delta x}{\Delta t}=\dfrac{2}{2} m/s =1 m/s. Isso é o que significa termos uma onda com velocidade bem definida se propagando na corda. Nesse caso, podemos dizer em termos mais matemáticos que:

y(x,t)=f(x-Vt)

É muito importante notar que nenhum ponto da corda está se movendo horizontalmente, mas sim todos estão se movendo para cima e para baixo de forma que o perfil da corda se mova para a direita. Em um caso mais geral, também pode haver uma onda progressiva se propagando para a esquerda, sendo assim, a forma mais geral para o perfil de uma onda em uma corda é:

y(x,t)=f(x-Vt)+g(x+Vt)

A seguir, calcularemos qual é essa velocidade de propagação no caso de uma corda que segue as condições impostas no início da aula.

Relação de Taylor

Analisemos um pulso que está se propagando com velocidade V para a direita em uma corda, conforme a imagem abaixo:

Note que no infinito todos os pontos estão parados, sendo essa nossa definição para o referencial do laboratório. Analisemos agora o fenômeno no referencial do pulso. Nesse referencial, todos os pontos que não pertencem ao pulso se movem com velocidade V para a esquerda. Para que a densidade da corda permaneça constante, todos os pontos ao longo do pulso também devem se mover com essa velocidade, mas ao longo da corda. Note que nesse referencial o pulso está parado. Lembrando das condições dadas no início da aula, podemos fazer a seguinte aproximação, consideremos um pequeno trecho próximo ao máximo desse pulso e o aproximemos para um pequeno arco de circunferência, conforme a figura abaixo.

Note que há duas trações tangenciais T que geram uma resultante centrípeta igual à:

F_{cp}=2T\cos \left( \dfrac{\pi}{2}-\dfrac{\Delta \theta}{2} \right)=2T\sin \left(\dfrac{\Delta \theta}{2}\right)

Utilizando a aproximação para pequenos ângulos:

F_{cp}=T\Delta \theta

Logo:

\dfrac{\Delta m V^{2}}{R}=T\Delta \theta

Substituindo a densidade linear \mu:

\Delta m=\mu R \Delta \theta

Logo:

T=\mu V^{2}

V=\sqrt{\dfrac{T}{\mu}}

Que é a relação de Taylor. Mais a frente, estudaremos uma maneira mais formal de derivar essa relação, ao mesmo tempo que demonstramos que ondas progressivas podem se propagar em uma corda, entretanto, os métodos utilizados necessitarão fortemente de derivadas parciais, portanto, não é tão importante para a OBF. A seguir, estudaremos as ondas mais importantes, as ondas harmônicas.

Ondas harmônicas

Uma onda é dita harmônica se a pertubação num dado ponto x realiza um M.H.S. Ou seja, no caso de uma corda, cada ponto da corda realiza um M.H.S. de frequência bem determinada. O perfil de uma onda desse tipo será dado por uma função senoidal:

y(x,t)=A\cos\left(k\left(x-Vt\right)+\delta \right)

Para uma onda progressiva para a direita, nesse caso, temos:

y(x,t)=A\cos\left(kx-\omega t+\delta \right)

Sendo:

\omega=kV

a frequência angular da onda. Além disso, temos que A é a amplitude da onda e k é o chamado número de onda que pode rapidamente se demonstrar que: k=\dfrac{2\pi}{\lambda}. É importante definir também a fase da onda que é \phi(x,t)=kx-\omega t+\delta e a fase inicial que é a constante \delta. É importante notar que a partir de alguns conceitos de cálculo ou de analogias com um M.H.S. pode-se determinar a velocidade u de qualquer ponto da corda:

u(x,t)=\dfrac{\partial y}{\partial t}=\omega A\sin\left(kx-\omega t +\delta \right)

Fato muito importante para a determinação da intensidade carregada por essas ondas. Uma pergunta que raramente é feita é o porquê dessas ondas serem tão importantes assim, tentarei deixar isso claro sem adentrar muito nos detalhes. Basicamente, a importância dessas ondas consiste no fato de que qualquer outro tipo de onda pode ser construída como uma interferência de diversas ondas senoidais. Ou seja, estudando esse caso particular, pode-se generalizar os resultados da ondulatória. Um exemplo da chamada série de Fourier é dada a seguir:

f\left(x\right)=\frac{8}{\pi^2}\sum_{n=0}^N\frac{\left(-1\right)^n}{\left(2n+1\right)^2}\sin\left(\frac{\left(2n+1\right)\pi x}{2}\right)

Ao colocar a fórmula acima para ser plotada em calculadoras gráficas como o site Desmos você verá que conforme aumenta o valor de N a função f se torna cada vez mais semelhante com uma onda triangular. Não se preocupe a respeito de como realizar esse tipo de cálculo pois é realmente desnecessário a nível de OBF, entretanto, é interessante saber a utilidade das ondas harmônicas. A seguir, calcularemos a intensidade carregada por uma onda harmônica. A seguir, são mostrados os gráficos para N=2 e N=20 para efeitos ilustrativos.

 

Intensidade carregada por uma onda harmônica

No caso de uma onda unidimensional a intensidade da onda é definida pelo valor médio temporal da potência que atravessa um certo ponto da onda, enquanto para ondas tridimensionais é o valor médio temporal da potência por unidade de área que atravessa um certo ponto da onda. Sendo assim, para uma onda harmônica unidimensional, temos que a energia em um comprimento dx é:

dE=dE_{cin}+dE_{pot}

Analisaremos primeiro o termo da energia cinética:

dE_{cin}=\dfrac{\mu dx}{2} u(x,t)^{2}

Substituindo a velocidade:

dE_{cin}=\dfrac{\mu \omega^{2} A^{2}}{2} \sin^{2} \left(kx-\omega t +\delta \right) dx

Para encontrarmos explicitamente o valor da energia potencial devemos notar que apesar de cada ponto da corda se mover somente verticalmente há uma mudança no comprimento da corda, digamos, dl em relação ao comprimento inicial dx. Essa mudança no comprimento é então:

dl=\sqrt{\left(dx\right)^{2}+\left(dy\right)^{2}}-dx

Como olhamos em um tempo fixo, vale:

dy=\dfrac{\partial y}{\partial x} dx

E, usando a aproximação binomial, temos:

dl=\dfrac{1}{2}\left(\dfrac{\partial y}{\partial x}\right)^{2}dx

Derivando, ou fazendo analogias com um M.H.S. encontramos:

\dfrac{\partial y}{\partial x}=-kA\sin\left(kx-\omega t+\delta \right)

Logo:

dE_{pot}=T\,dl=\dfrac{1}{2}Tk^{2}A^{2} \sin^{2}\left(kx-\omega t +\delta \right) dx

Logo a potência é:

Pot=\dfrac{dE}{dt}

Pot=V \left(\dfrac{\mu \omega^{2} A^{2}}{2} sin^{2} \left(kx-\omega t +\delta \right) +\dfrac{1}{2}Tk^{2}A^{2} sin^{2}\left(kx-\omega t +\delta \right) \right)

Devemos lembrar que k=\dfrac{\omega}{V} e V=\sqrt{\dfrac{T}{\mu}}. Como falamos que a intensidade é o valor médio da potência, substituiremos o resultado conhecido que o valor médio do quadrado da função seno é \dfrac{1}{2}. (A demonstração necessita de cálculo integral). Sendo assim:

I=\sqrt{\dfrac{T}{\mu}}\left(\dfrac{\mu \omega^{2} A^{2}}{4}+\dfrac{\mu \omega^{2} A^{2}}{4} \right)

I=\dfrac{\sqrt{\mu T}\omega^{2}A^{2}}{2}

Que demonstra o resultado conhecido de que a intensidade de uma onda é proporcional ao quadrado da sua amplitude.

A seguir, estudaremos rapidamente um conceito mais formável que não é muito necessário à nível de OBF, mas que demonstra que seguindo as condições estabelecidas no início da aula realmente podem se propagar ondas progressivas em ambas as direções. Essa parte necessitará de muito cálculo.

Equação para ondas transversais se propagando em uma corda

A equação de onda será uma equação diferencial parcial de segunda ordem linear, do seguinte formato:

V^{2}\dfrac{\partial ^{2} y}{\partial x^{2}}=\dfrac{\partial^{2} y}{\partial t^{2}}

Rapidamente nota-se que soluções do tipo f(x-Vt) ou g(x+Vt) são realmente aceitas pois:

df=f'd(x-Vt)

df=f'dx-Vf'dt

Logo:

\dfrac{\partial f}{\partial t}=-Vf'

e

\dfrac{\partial f}{\partial x}=f'

Repetindo o procedimento:

\dfrac{\partial^{2} f}{\partial t^{2}}=V^{2}f''

e

\dfrac{\partial^{2} f}{\partial x^{2}}=f''

Sendo assim, vale:

V^{2}\dfrac{\partial ^{2} y}{\partial x^{2}}=\dfrac{\partial^{2} y}{\partial t^{2}}

O mesmo pode ser realizado para uma função g(x+Vt) e consequentemente para a soma das duas anteriores, pois a equação é linear. Sabendo disso, agora devemos mostrar que uma corda realmente segue essa equação para ondas transversais. Considere um pequeno pedaço da corda de comprimento dx e escrevamos a segunda lei de Newton em y para esse pedaço:

dm \dfrac{\partial^{2} y}{\partial t^{2}}=T \left(\sin \left(\theta(x+dx)\right)-\sin \left(\theta(x)\right)\right)

Utilizando a aproximação para pequenos ângulos \sin \left( \theta \right) \approx \tan \left( \theta \right), temos:

\mu \dfrac{\partial^{2} y}{\partial t^{2}}dx=T\left(\dfrac{\partial y}{\partial x}(x+dx)-\dfrac{\partial y}{\partial x}(x)\right)

\mu \dfrac{\partial^{2} y}{\partial t^{2}}dx=T\dfrac{\partial^{2} y}{\partial x^{2}}dx

\dfrac{\partial^{2} y}{\partial t^{2}}=\dfrac{T}{\mu}\dfrac{\partial^{2} y}{\partial x^{2}}

Que é a equação de onda com V=\sqrt{\dfrac{T}{\mu}}, demonstrando também a relação de Taylor dessa maneira.

Na próxima aula de ondulatória estudaremos fenômenos de interferências entre ondas, como batimentos, além dos chamados modos normais de vibração de uma corda.