Física - Ideia 20

Escrito por Paulo Henrique

Apesar dessa ideia apresentar somente conteúdos cobrados a partir da OBF Nível 2 é importante notar que o nível dessa ideia é realmente avançado, sendo improvável de ser cobrado na prova da OBF, entretanto, possível principalmente nas provas da seletiva.

Introdução

Considere um sistema com uma parâmetro característico \lambda. Suponha que esse mesmo parâmetro seja variado lentamente ("adiabaticamente") via agentes externos. Agora, seja I uma determinada grandeza mecânica. Por hipótese, é necessário um tempo T para que \lambda mude apreciavelmente. Dizemos que I é um invariante adiabático se T\gg{\tau} onde \tau é o intervalo de tempo característico do sistema, ou seja, um intervalo da ordem de grandeza dos que lidamos quando analisamos o sistema. Por exemplo, considere um pêndulo simples de comprimento l e que \lambda=l, em outras palavras, l é variado adiabaticamente (pode-se fazer isso puxando o fio lentamente através de um buraco no ponto de suporte). Neste caso, T deve ser muito maior que t=2\pi\sqrt{\frac{l}{g}}, o período do pêndulo. Nessa condição, é dito que o pêndulo está sofrendo uma transformação adiabática.

Oscilador Harmônico

Neste exemplo, será mostrado que a quantia \frac{E}{f} de um ocilador harmônico de frequência dependente do tempo é invariante adiabático. Começemos pela a energia desse ocilador

E=\dfrac{mv^2}{2}+\dfrac{m{\omega}^2x^2}{2}          (1)

Observe que este poderia ser o caso do pêndulo simples com {\omega}^2=g/l e l variando adiabaticamente.

Tomando a derivada com relação ao tempo, temos

\dfrac{dE}{dt}=mva+m{\omega}^2xv+m{\omega}x^2\dfrac{d\omega}{dt}          (2)

Onde a é a aceleração. Como é de costume em problemas desse tipo, há termos que variam rapidamente e outros lentamente. Os rápidos executam um grande número de oscilações, de modo que podemos substituí-los pelos seus valores médios num período de oscilação. Estes são os dois primeiros termos do lado direito de (2). Agora, perceba que a média do produto va em um período é

(va)_{m}=0         (3)

Assim como é nulo o valor médio xv. Pode-se concluir isso tendo em vista a simetria do ocilador harmônico. Mas, de qualquer forma, você é encorajado a calcular esse valores na mão: use a solução do oscilador harmônico A\cos \left(\omega t+\phi \right) e proceda usualmente para calcular a média. Obs: no cálculo dessas médias \omega é tido como constante, devido a hipótese que o processo é adiabático. A solução do oscilador harmômico também permanece inalterada, visto que tudo será calculado dentro de um período. Dessa forma, ficamos com

dE/E=d{\omega}/{\omega}

Integrando, conclui-se que (usando \omega=2{\pi}f) E/f=contante, ou seja, é invariante adiabático.

 

Espaço de fase

Nessa secção iremos enunciar um importante teorema do invariante adiabático, infelizmente, sua demonstração é complicada e não é o foco dessa aula.

Considere que uma partícula possui um movimento oscilatório. Conforme dito antes, suponha que \tau\ll{T}. Nessa transformação adiabática, I, o invariante adiabático é conservado. O último é dado pela área sob o gráfico de p_x por x (p_x é o momento correspondente a coordenada x). O gráfico p_x por x é chamado de espaço de fase. Ou seja, dado um movimento, possivelmente oscilatório, traçamos o gráfico p_x(t) por x(t) em um período completo: a área sob a curva é conservada durante todo o movimento. Evidentemente, essa área não é perfeitamente conservada. Mas a precisão  aumenta conforme a razão \tau/T diminui. Esse resultado é muito importante em toda física. Ele é utilizado desde Termodinâmica até Mecânica Quântica. 

Esfera, parede e bloco

Uma pequena esfera de massa m=1g se move em uma superfície horizontal, indo pra frente e pra trás colidindo com uma parede e uma bloco. A massa do bloco é M=100kg, a velocidade inicial da esfera é v_0=10m/s. Qual a velocidade da esfera no momento em que a distância do bloco a parede dobrou comparado ao valor inicial?

 Como a massa do bloco é muito maior que a da esfera, a velocidade adquirida pelo bloco após uma colisão é baixa. Ou seja, a sua distância até a parede varia lentamente (adiabaticamente). Logo, devemos conservar o invariante adiabático (área do espaço de fase) entre os dois momentos (inicial e final). Para a partícula, o espaço de fase é um retângulo de lados L e 2mv, onde L é a distância do bloco a parede e v é a velocidade da esfera. Portanto, o invariante adiabático é

I=2mvL

A massa da partícula é constante, portanto, como a distância dobrou, a velocidade deve ser reduzida à metade, afim de manter I constante. 

v_F=5m/s

Pêndulo com amigos

Duas massas, A e B, que possuem massa m estão ligadas por uma corda e duas polias sem massa. Inicialmente, o comprimento de cada fio é l, então, a massa A recebe um pequeno impulso e balança com amplitude \epsilon\ll{l}. Depois de muito tempo mesmo, uma das massas atinge a polia. Qual massa atingiu a polia? 

 

Primeiramente, identifiquemos qual parâmetro varia adiabaticamente: o comprimento l do fio. Sendo assim, a massa da esquerda é um pêndulo simples com comprimento que varia lentamente. Como o movimento é oscilatório, devemos trabalhar com valores médio sempre que possível. Dessa forma, tratando o conjunto da esquerda como um pêndulo simples, determinemos o valor médio da componente vertical da tração. Defina \theta como sendo o ângulo que o fio faz com a vertical. Por força centrípeta

T-mg\cos{\theta}=\dfrac{mv^2}{l}

Por conservação de energia (seja {\theta}_0 a amplitude angular inicial)

v^2=2gl(\cos{\theta}-\cos{{\theta}_0})

Sendo assim

T(\theta)=mg(3\cos{\theta}-2\cos{{\theta}_0})

A componente em y é obtida multiplicando a equação acima por \cos{\theta}. Observe que durante o movimento da massa, o ângulo \theta é sempre menor ou igual a {\theta}_0. Logo

\cos{\theta}\ge{\cos{{\theta}}_0}

Sendo assim

T(\theta)\le{mg\cos{{\theta}_0}}

Como \cos{{\theta}_0}\le{1}

T(\theta)\le{mg}

E

T_{med}<mg

O valor médio da componente da vertical também será menor que mg. Portanto, a massa da esquerda tende a descer após vários períodos. Dessa forma, a massa que atinge a polia é a da direita. 

Pêndulo, de novo

A corda de um pêndulo simples passa através de um pequeno buraco no teto. A corda é puxada muito lentamente para cima. A amplitude linear do pêndulo muda? Se muda, como?

Sabemos que o comprimento do fio varia lentamente, portanto, as grandezas características do sistema (comprimento do fio, amplitude, etc) praticamente não mudam durante uma oscilação completa. Sendo assim, a segunda lei de Newton é escrita normalmente e a solução é dada por (para o ângulo com a vertical). Seja \epsilon=A/l, onde \epsilon é amplitude angular, A a amplitude linear e l o comprimento instantâneo do fio.

{\theta}(t)={\epsilon}\sin{{\omega}t}

e

v(t)={\epsilon}l{\omega}\cos{{\omega}t}

Que são as solução usuais do oscilador harmônico (pequenas oscilações). \omega é, evidentemente, a frequência angular \sqrt{g/l}. Novamente, buscamos o valor médio da tração. Por força centrípeta

T=mg\cos{\theta}+\dfrac{mv^2}{l}\approx{mg(1-\dfrac{{\theta}^2}{2})+\dfrac{mv^2}{l}}

Na equação acima, foi feita a aproximação para pequenos ângulos. Usando a solução para {\theta}(t) podemos expressar T em função do tempo. O resultado é

T(t)=mg+mg{\epsilon}^2((\cos{{\omega}t})^2-(\sin{{\omega}t})^2/2)

Usando os valores médios das função trigonométricas ao quadrado (1/2). Temos

T_{med}=mg(1+{\epsilon}^2/4)

Por outro lado, a energia total do pêndulo é (com o zero de energia potencial no teto)

E=-mgl+\dfrac{m{v_{max}}^2}{2}=-mgl+m{\epsilon}^2{l}^2{\omega}^2/2

Usando o valor de \omega

E=mgl(-1+{\epsilon}^2)

Quando o comprimento do fio muda por \Delta{l} e amplitude angular por \Delta{\epsilon}, a energia muda por

\Delta{E}=mg\Delta{l}(-1+{\epsilon}^2/2)+mgl{\epsilon}\Delta{\epsilon}

Podemos aplicar o teorema da energia cinética e escrever que

T_{med}\Delta{l}=-\Delta{E}

Com \Delta{l}<0. Fazendo a operação da equação acima chegamos em

\dfrac{\Delta{\epsilon}}{\epsilon}=-\dfrac{3\Delta{l}}{4l}>0  (*)

Como a amplitude linear é A=l{\epsilon}

\dfrac{\Delta{A}}{A}=\dfrac{\Delta{\epsilon}}{{\epsilon}}+\dfrac{\Delta{l}}{l}=\dfrac{1}{4}\dfrac{\Delta{l}}{l}<0

Logo, a amplitude diminui. Se multiplicarmos (*) por l^3{\epsilon}^4, teremos

4l^3{\epsilon}^3\Delta{{\epsilon}}+3l^2{\epsilon}^4\Delta{l}=0

Isso pode ser escrito como sendo

\Delta({l^3{\epsilon}^4})=0

Ou seja, a quantia l^3{\epsilon}^4 é um invariante adiabático. Você pode mostrar que esse resultado é análogo ao que foi obtido no primeiro exemplo.

Problemas

1- Para o exemplo "Pêndulo com amigos" determine a velocidade da massa que atinge a polia imediatamente antes da colisão.

2- Desenhe o espaço de fase para um M.H.S. unidimensional

3- Mostre que \dfrac{E}{f} é constante ao longo de um movimento harmônico a partir da área do espaço de fase.