Física - Ideia 25

Escrita por Antonio Italo

Nessa ideia, chegaremos a chamada equação de Binet. Essa equação diferencial é utilizada para encontrarmos a equação da trajetória de um corpo submetido a uma força central, por exemplo, essa equação pode ser utilizada para mostrar que os planetas do sistema solar se movem numa elipse com foco no sol, a partir da expressão da força gravitacional (O oposto também pode ser feito). A seguir, vamos ver a definição dessa equação e uma aplicação da mesma a partir da lei da gravitação universal. OBS: Apesar do conteúdo dessa ideia estar presente desde o Nível 2 da OBF, as técnicas utilizadas aqui são bem avançadas, envolvendo cálculo e eq. diferenciais simples, sendo mais recomendada para quem estiver estudando para provas mais avançadas como a da própria seletiva de Física.

Demonstração

Para iniciar, devemos escrever a equação do movimento para um corpo submetido a uma força central, ou seja, uma força do tipo:

\vec{F}=F(r)\hat{r}

Já que a força é central, sabemos que o movimento se limitará a um plano, devido a conservação do vetor momento angular, dado por:

\vec{L}=\vec{r}\times \vec{p}=m \vec{r} \times \vec{v}

Essa conservação pode ser demonstrada se derivarmos o vetor momento angular e aplicarmos a regra do produto:

\dfrac{d\vec{L}}{dt}=\dfrac{d\vec{r}}{dt}\times \vec{p} +\vec{r} \times \dfrac{d\vec{p}}{dt}=\vec{v} \times \vec{p} +\vec{r}\times \vec{F}=\vec{0}

Note que isso é zero, pois tanto \vec{v} é paralelo à \vec{p} quanto \vec{r} é paralelo à \vec{F}, já que \vec{F} é central. Sabendo disso, podemos utilizar um sistema de coordenadas bidimensional. Nesse caso, utilizaremos um sistema de coordenadas polar \left(r,\theta \right). Em coordenadas polares, as equações de movimento ficam:

F(r)=m \left( \ddot{r} - r \dot{\theta}^{2}\right)

0= m \left(2\dot{r}\dot{\theta}+ r \ddot{\theta}\right)

A segunda equação leva diretamente a conservação do momento angular:

L= m r^{2} \dot{\theta}

E a primeira equação dará origem à equação de Binet, quando aplicarmos a seguinte substituição de variável:

u=\dfrac{1}{r}

Mas antes disso, perceba que podemos trocar:

\dfrac{d}{dt} \rightarrow \dot{\theta} \dfrac{d}{d\theta} \rightarrow \dfrac{Lu^{2}}{m} \dfrac{d}{d\theta}

utilizando a regra da cadeia. Sabendo disso, calculemos \ddot{r} em função de L, m, u e suas derivadas.

\dot{r}=\dfrac{d\left(\dfrac{1}{u}\right)}{dt}=-\dfrac{1}{u^{2}}\dot{u}=-\dfrac{L}{m}\dfrac{du}{d\theta}

Derivando novamente:

\ddot{r}=-\dfrac{L^{2}u^{2}}{m^{2}} \dfrac{d^{2}u}{d \theta^{2}}

Agora, substituindo o valor de \ddot{r} e de \dot{\theta} na equação de movimento radial, obtemos:

-\dfrac{L^{2}u^{2}}{m^{2}} \dfrac{d^{2}u}{d \theta^{2}}-\dfrac{1}{u} \dfrac{L^{2}u^{4}}{m^{2}}=\dfrac{F}{m}

\dfrac{d^{2}u}{d\theta^{2}}+u=-\dfrac{mF}{L^{2}u^{2}}

Que é a equação de Binet. A seguir, apliquemos ela para a lei da gravitação universal e verifiquemos sua utilidade.

Órbitas Cônicas

Da lei da gravitação universal de Newton, sabemos que:

F(r)=-\dfrac{GMm}{r^{2}}=-GMmu^{2}

no caso gravitacional. Substituindo essa força na equação de Binet, obtemos:

\dfrac{d^{2}u}{d\theta^{2}}+u=\dfrac{GMm^{2}}{L^{2}}

Sendo essa equação consideravelmente simples de se resolver. Muitos devem estar familiarizados com equações do tipo:

\dfrac{d^{2}u}{d\theta^{2}}+u=0

Pois essa equação é muito conhecida em problemas de M.H.S., porém, obtivemos uma equação com uma constante do outro lado, dessa forma devemos somar uma constante à solução padrão do M.H.S. para obtermos a solução geral. Nesse caso, temos então que:

u(\theta)=\dfrac{GMm^{2}}{L^{2}}+B* \cos \left(\theta - \theta_{0}\right)

Sobre a constante \theta_{0}, podemos dar a mesma qualquer valor, já que há uma ambiguidade na posição \theta=0, sendo assim, por conveniência, façamos \theta_{0}= 0

A equação da trajetória é então do tipo:

r(\theta)=\dfrac{\dfrac{L^{2}}{GMm^{2}}}{1+\epsilon \cos \theta}=\dfrac{l}{1+\epsilon \cos \theta}

Que é a equação geral de uma cônica (Elipse, Parábola ou Hipérbole) a partir de um dos focos. A constante l é o chamado semi-lactus rectum da cônica e \epsilon é a excentricidade da cônica. Essas constantes são determinadas pela energia e pelo momento angular da partícula submetida ao potencial central.

Órbita circular diferenciada

Uma partícula realiza uma órbita circular de raio R sujeita à uma força centra F(r), com centro de força (Local para onde a força central aponta) em um ponto pertencente à órbita (ver Imagem). Qual é o formato da força? Esse é outro tipo de problema típico onde a equação de Binet pode ser utilizada!

Para resolvermos o problema, basta acharmos a expressão para u e \dfrac{d^{2}u}{d\theta^{2}} em função de r e substituirmos na equação de Binet. O primeiro passo é simples, por definição:

u=\dfrac{1}{r}

Mas devemos achar u em função de \theta. Definamos aqui \theta como o ângulo entre a reta que liga o centro de força e a partícula com a reta que liga o centro de força ao centro da órbita. Temos que:

\left(r \sin \theta \right)^{2}+\left(r \cos \theta - R \right)^{2} =R^{2}

Logo:

r^{2}-2Rr \cos \theta + R^{2}=R^{2}

r=2R \cos \theta

Portanto:

u=\dfrac{1}{2R \cos \theta}

E, daí, utilizando as derivadas do produto, da secante e da tangente, além da relação fundamental da trigonometria:

\dfrac{d^{2} u}{d \theta^{2}}=\dfrac{d}{d\theta}\left(\dfrac{\tan \theta \sec \theta}{2R}\right)=\dfrac{\sec^{3} \theta +\left(\sec^{2} \theta -1 \right) \sec \theta}{2R}

Aplicando na equação de Binet:

u+ \dfrac{d^{2} u}{d\theta^{2}}= \dfrac{\sec^{3} \theta}{R}=-\dfrac{mr^{2}F(r)}{L^{2}}

Mas note que \sec \theta = \dfrac{2R}{r}, logo:

\dfrac{8R^{2}}{r^{3}}=-\dfrac{mr^{2}F(r)}{L^{2}}

Logo:

F(r)=-\dfrac{8R^{2}L^{2}}{mr^{5}}

Logo, temos uma força proporcional a \dfrac{1}{r^{5}}.

Exercícios Relacionados

1 - Órbita Espiral (MIT)

Uma partícula se move em duas dimensões sobre ação de uma força central determinada pelo potencial V(r)=\alpha r^{p}+ \beta r^{q}, encontre os valores de p e q para que a partícula possa se mover em uma órbita espiral da forma r(\theta)=c \theta^{2}, com c sendo uma constante.

2 - Força central de uma órbita (Princeton)

Encontre a força central que resulta na seguinte órbita para uma partícula:

r(\theta)=a\left(1+\cos \theta \right)

3 -  Encontro Terra-Cometa (Princeton)

Calcule o máximo tempo que um cometa de massa m seguindo uma trajetória parabólica (Dica: \epsilon=1) ao redor do sol pode gastar dentro da órbita da Terra. Assuma que a órbita da Terra é circular e está no mesmo plano que a do cometa. (Ver figura).

4 - Trivial, mas de outro jeito (David Morin, adaptada)

É um fato conhecido que quando a força sobre um corpo é nula sua trajetória será uma reta (se o mesmo estiver se movendo), contudo, esse fato é um pouco confuso em coordenadas polares. Utilizando a equação de Binet, encontre a trajetória do corpo em coordenadas polares e mostre que essa é uma reta.

5 - Casos e casos

Encontre a equação da trajetória de uma partícula submetida à uma força central do tipo F(r)=\dfrac{K}{r^{3}}. Analise os diferentes casos.