Física - Ideia 33

Escrito por Wanderson Faustino Patricio

Breve introdução ao Método de Euler-Lagrange

As leis de Newton são bastante conhecidas pelos estudantes de física do ensino, especialmente a 3^a lei.

Você já pode ter ouvido a frase: "Para resolver questões de mecânica é só usar \vec F=m\vec a". Bom, para problemas de ensino médio, muitas vezes, esse é o método mais fácil de analisar. Porém, alguns problemas podem dificultar essa análise de forças.

Visto essa dificuldade, é interessante procurar outros métodos para analisar o movimento dos corpos. Outro método bastante usual é analisar a energia mecânica do sistema.

Nessa procura, Euler e Lagrange encontraram um método de análise de movimento sem a necessidade de procurar necessariamente as forças lá presssentes.

"Jogando" o método de Euler-Lagrange

Sejam a energia cinética e potencial de um corpo T e V respectivamente. Definamos a lagrangiana (L) tal que:

L=T-V

Você deve estar estranhando esse sinal negativo na energia potencial, visto que na energia mecânica esse sinal é positivo, mas vamos entender a razão disso já já.

Esteja a nossa langrangiana sendo analisado para um parâmetro q (seja intervalo angular, distância, ou outra coisa). Temos a seguinte relação:

\dfrac{d}{dt}\left(\dfrac{\partial{L}}{\partial{\dot q}}\right)=\dfrac{\partial{L}}{\partial{q}}

Isso parece um pouco jogado, mas não, se preocupe, vamos mostrar de onde isso vem depois, Primeiro vejamos como essa alternativa funciona perfeitamente.

Vejamos o caso do oscilador harmônico.

A energia cinética é T=\dfrac{1}{2}m\dot{x}^2 e a energia potencial é V=\dfrac{1}{2}kx^2. Logo:

L=\dfrac{1}{2}m\dot{x}^2-\dfrac{1}{2}kx^2

\dfrac{\partial L}{\partial{\dot x}}=m\dot x \rightarrow \dfrac{d}{dt}\left(\dfrac{\partial{L}}{\partial{\dot q}}\right)=m\ddot x e \dfrac{\partial L}{\partial x}=-kx

Logo:

m\ddot x=-kx

A mesma equação que chegamos ao analisar diretamente as forças.

Você pode estar pensando: " Ah, mas isso é uma coincidência muito grande". Vejamos o porquê de não ser:

Seja o nosso potencial V=V(x) e a energia cinética é T=\dfrac{1}{2}m\dot{x}^2.

\rightarrow \dfrac{\partial L}{\partial{\dot x}}=m\dot x \rightarrow \dfrac{d}{dt}\left(\dfrac{\partial{L}}{\partial{\dot q}}\right)=m\ddot x e \dfrac{\partial L}{\partial x}=-\dfrac{\partial V}{\partial x}=F

Logo:

F=m\ddot x ou \vec F=m\vec a

Para um espaço tridimensional:

V=V(x,y,z) e T=\dfrac{1}{2}m(\dot{x}^2+\dot{y}^2+\dot{z}^2)

\rightarrow L=\dfrac{1}{2}m(\dot{x}^2+\dot{y}^2+\dot{z}^2)-V(x,y,z)

Semelhante ao sistema anterior, como os eixos não estão conectados, podemos analisar cada eixo separadamente. Caso contrário, seria necessário relacionar os eixos antes de aplicar a lagrangiana.

\begin{cases} m\ddot x=-\dfrac{\partial V}{\partial x} \\ m\ddot y=-\dfrac{\partial V}{\partial y} \\m\ddot z=-\dfrac{\partial V}{\partial z} \end{cases}

Portanto:

m(\ddot x \hat x+ \ddot y \hat y +\ddot z \hat z)=-\dfrac{\partial V}{\partial x}\hat x -\dfrac{\partial V}{\partial y}\hat y -\dfrac{\partial V}{\partial z}\hat z

\rightarrow m\vec{\ddot r}=-\nabla V

Como \vec F=-\nabla V temos:

\vec F=m\vec{a}

Podemos perceber que o método de Euler-Lagrange é, portanto, uma maneira diferente de analisar o movimento, mas que leva aos mesmos resultados das equações newtonianas.

De onde vem a Lagrangiana?

Sabemos que o universo não gosta de energias muito grandes, as forças e campos sempre procuram estados de mínima variância para oscilações de estados.

Tomemos portanto a função ação (S) definida por:

S\equiv \displaystyle \int_{t_1}^{t_2}L(x, \dot x, t) dt

Perceba que a ação é função não apenas de x(t), mas também de suas derivadas. Diferente de outra função qualquer, ela não depende apenas de um valor de entrada, mas de como ocorrem as variações desses valores de entrada.

Podemos encontrar o valor para nossa ação com qualquer função L.

Devemos agora encontrar para quais valores de L teremos uma estado estacionário de S, ou seja, para os quais as variações pequenas de estados não produzirão variações de estados de energia?

Para nosso estado estacionário, S será mínimo, máximo, ou constante, indicando constância energética.

Considere que a nossa função x(t) possui valores definidos para t_1 e t_2: x(t_1)=x_1 e x(t_2)=x_2. Considere que a função x_0(t) produz um valor estacionário de S, e que atende os valores para t_1 e t_2.

Comsidere outra função x(t) que também atende as condições, mas que difere de x_0(t):

x_p(t)=x_0(t)+p\cdot \beta (t)

Onde \beta (t_1)=\beta (t_2)=0.

x_p(t) também deve produzir um valor estacionário para S independente do valor de p.

\dfrac{\partial S}{\partial p}=\dfrac{\partial}{\partial p} \displaystyle \int_{t_1}^{t_2} L dt=\displaystyle \int_{t_1}^{t_2} \dfrac{\partial L}{\partial p} dt

\dfrac{\partial S}{\partial p}=\displaystyle \int_{t_1}^{t_2} \left(\dfrac{\partial L}{\partial x_p}\dfrac{\partial x_p}{\partial p}+\dfrac{\partial L}{\partial \dot{x}_p}\dfrac{\partial \dot{x}_p}{\partial p}\right) dt

Olhando para x_p(t) temos:

\dfrac{\partial x_p}{\partial p}=\beta e \dfrac{\partial \dot{x}_p}{\partial p}=\dot{\beta}

Portanto:

\dfrac{\partial S}{\partial p}=\displaystyle \int_{t_1}^{t_2} \left(\dfrac{\partial L}{\partial x_p}\beta+\dfrac{\partial L}{\partial \dot{x}_p}\dot{\beta}\right) dt

Integrando a segunda parte de integral por partes temos:

\displaystyle \int_{t_1}^{t_2}\dfrac{\partial L}{\partial \dot{x}_p}\dot{\beta} dt=\left[\dfrac{\partial L}{\partial \dot{x}_p}\beta\right] _{t_1}^{t_2}-\displaystyle \int_{t_1}^{t_2} \left[\dfrac{d}{dt}\left(\dfrac{\partial L}{\partial \dot{x}_p}\right)\right]\beta dt

Juntando as duas partes da integral:

\dfrac{\partial S}{\partial p}=\displaystyle \int_{t_1}^{t_2} \dfrac{\partial L}{\partial x_p}\beta dt+\left[\dfrac{\partial L}{\partial \dot{x}_p}\beta\right] _{t_1}^{t_2}-\displaystyle \int_{t_1}^{t_2} \left[\dfrac{d}{dt}\left(\dfrac{\partial L}{\partial \dot{x}_p}\right)\right]\beta dt

\rightarrow \dfrac{\partial S}{\partial p}=\displaystyle \int_{t_1}^{t_2} \left[\dfrac{\partial L}{\partial x_p}-\dfrac{d}{dt}\left(\dfrac{\partial L}{\partial \dot{x}_p}\right)\right]\beta dt +\left[\dfrac{\partial L}{\partial \dot{x}_p}\beta\right] _{t_1}^{t_2}

Como \beta(t_1)=\beta(t_2)=0 tiramos que:

\left[\dfrac{\partial L}{\partial \dot{x}_p}\beta\right] _{t_1}^{t_2}=0

\rightarrow\dfrac{\partial S}{\partial p}=\displaystyle \int_{t_1}^{t_2} \left[\dfrac{\partial L}{\partial x_p}-\dfrac{d}{dt}\left(\dfrac{\partial L}{\partial \dot{x}_p}\right)\right]\beta dt

Como x_p(t) produz um estado estacionário para S: \dfrac{\partial S}{\partial p}=0

Portanto, chegamos à:

\dfrac{d}{dt}\left(\dfrac{\partial L}{\partial \dot{x}_p}\right)=\dfrac{\partial L}{\partial x_p}

Forças de contato (ou restrição)

Vimos que o método de Euler-Lagrange nos entrega a equação do movimento pronta. Mas e se quisermos analisar as forças de contato, podemos utilizar esse método?

Vejamos o exemplo de uma massa descendo uma cunha esférica.

Temos que T=\dfrac{1}{2}mR^2\dot{\theta}^2 e V=mgR\cos{\theta}. Logo:

L=\dfrac{1}{2}mR^2\dot{\theta}^2-mgR\cos{\theta}

\rightarrow\dfrac{d}{dt}\left(\dfrac{\partial L}{\partial \dot{\theta}}\right)=mR^2\ddot{\theta} e \dfrac{\partial L}{\partial \theta}=mgR\sin{\theta}.

\rightarrow \ddot{\theta}=\left(\dfrac{g}{R}\right)\sin{\theta}

Perceba que em nenhum momento a força de contato normal apareceu. Então como podemos encontrá-la?

Suponha que o raio não é constante. Para isso, adicionaremos um potencial devido à normal em nossa lagrangiana:

L=\dfrac{1}{2}m(\dot{r}^2+r^2\dot{\theta}^2)-mgr\cos{\theta}-V(r)

\rightarrow \dfrac{d}{dt}\left(\dfrac{\partial L}{\partial \dot r}\right)=m\ddot r e \dfrac{\partial L}{\partial r}=mr\dot{\theta}^2 - mg\cos{\theta} -\dfrac{dV(r)}{dr}

Para r=R=cte, \dot r=\ddot r=0, e -\dfrac{dV(r)}{dr}=N. Portanto:

N=mg\cos{\theta}-mR\dot{\theta}^2

O mesmo resultado que é encontrado aplicando a equação da resultante centrípeta.

Para memorizar

1- Quase um ioiô (David Morin - Introduction to Classical Mechanics)

Uma massa m pode deslizar livremente sobre uma mesa sem atrito. Esta massa m está conectada por uma corda, através de um buraco que passa pela mesa e está conectada também a uma massa M.

Inicialmente a massa m está realizando um movimento cirular de raio r_0 sobre a mesa, quando recebe um pequeno impulso na direção radial, e começa a oscilar em torno do raio inicial.

Qual o período dessa oscilação?

A gravidade local é g.

2 - Que potencial é esse?

um corpo de massa m se move no eixo x de um plano cartesiano comum sobre a ação de uma energia potencial na forma:

V(x)=\dfrac{bx}{a^2+x^2}

Qual é o período de oscilação dessa massa ao redor da posição de eqílibrio estável?

3 - Isso é um pêndulo? (David Morin - Introduction to Classical Mechanics)

Duas massas iguais m estão conectadas por uma corda sem massa e sustentadas no teto por polias de tamanho desprezível.

 

Escreva as equações do movimento nas variáveis r é \theta.

4 - Oscilação de novo? (David Morin - Introduction to Classical Mechanics)

Uma massa m está presa por um furo à um aro circular de raio R que gira com velocidade angular \omega ao redor de seu eixo.

Qual o período de oscilação da massa para pequenos deslocamentos ao redor da posição de equilíbrio?

Considere A gravidade local g.

5 - A de plano inclinado

Uma massa m é posta em cima de uma cunha de massa M e ângulo de inclinação \theta em relação à horizontal.

A gravidade no local é g.

Qual é a aceleração da massa m?

6 - Somente o necessário (David Morin - Introduction to Classical Mechanics)

Um objeto pontual de massa m desliza com velocidade v ao longo de uma curva num plano cartesiano x-y dada por y=f(x).

Qual é a força que a curva aplica no objeto?