Tipos de Telescópios Ópticos

Por Fabrizio Melges Ferro

Atualmente, a astronomia observacional não se restringe apenas ao espectro eletromagnético. O emergente campo da astronomia multi mensageira visa estudar fontes astronômicas usando diferente tipos de partículas “mensageiras” como fótons, neutrinos, raios cósmicos e ondas gravitacionais. A parte mais familiar desse campo permanece no regime visível ao olho humano (aproximadamente 400700\ nm). Consequentemente, telescópios e detectores feitos para analisar a radiação na faixa do espectro visível serão abordados com mais detalhes. Além do mas, boa parte do que for aprendido estudando instrumentos ópticos se aplicará a outras regiões do espectro eletromagnético.

Nas observações astronômicas, o telescópio realiza três principais tarefas:

  1. Coletar luz de uma maior área, tornando possível o estudo de fontes fracas.
  2. Melhorar a resolução e aumentar o diâmetro angular do objeto.
  3. Medir a posição do objeto.

Os telescópios ópticos podem ser divididos em três grupos, refletores (sistema da objetiva emprega apenas espelhos), refratores (sistema da objetiva emprega apenas lentes) e compostos ou catadióptricos (sistema da objetiva emprega uma combinação de lentes e espelhos).

Telescópios Refratores

O design óptico que Galileu usou em seu telescópio refrator em 1609 é usualmente chamado de Telescópio Galileano(ver figura 1). O design de Galileu usava uma lente convergente de grande comprimento focal, a objetiva, e uma lente divergente de comprimento focal menor, a ocular, colocada atrás do ponto focal.

O objetivo da lente objetiva é coletar o máximo de luz possível e com a maior resolução possível, trazendo a luz para o plano focal. A imagem pode ser vista utilizando uma ocular, que servirá como uma lente magnificadora.

Figura 1: Design óptico do telescópio Galileano.

Entretanto, a magnificação do refrator Galileano era limitada pela dificuldade de se produzir lentes divergentes de curto comprimento focal. Johannes Kepler, no seu livro Dioptrice publicado em 1611, explicou que seria melhor construir um telescópio com duas lentes convexas. Kepler explicou que uma lente convexa na ocular, colocada após o foco, produzia um campo maior e com maior magnificação do que uma lente côncava. Essa configuração fornece uma imagem invertida, mas isso é insignificante ao olhar objetos no céu. O design de Kepler é também chamado de refrator Kepleriano ou refrator astronômico, sendo muito usado até hoje.

 

Figura 2: Design óptico do telescópio Kepleriano.

Por mais que o refrator Kepleriano possa produzir elevadas magnificações com mais facilidade do que o refrator Galileano, os dois refratores possuem outros problemas que limitam seu uso. Esses problemas são conhecidos como aberrações.

Aberração Cromática

A aberração cromática surge do fato do comprimento focal da lente ser dependente do comprimento de onda. Como o índice de refração varia com o comprimento de onda, o ângulo de refração na interface entre dois diferentes meios também deve depender do comprimento de onda. Isso resulta em um comprimento focal que depende do comprimento de onda, e consequentemente, o ponto focal da luz azul difere do ponto focal da luz vermelha.

 

Figura 3: Aberração Cromática. Raios de luz de diferentes cores são refratados para diferentes pontos focais.

O problema da aberração cromática pode ser reduzido pela adição de uma ou várias lentes de correção (ver figura 3). A demonstração desse procedimento será deixada como exercício para o leitor.

Outras Aberrações

Com o passar do tempo, telescópios com maiores objetivas foram sendo necessários para observações astronômicas. Todavia, existem limitações práticas para o tamanho da lente objetiva de um telescópio refrator. Como a luz deve passar pela lente, todo o seu volume deve ser quase opticamente perfeito. Além do mais, ambas as superfícies da lente devem manter irregularidades menores que uma fração do comprimento de onda, tipicamente 1/20. lembrando que o comprimento de onda da luz visível é de aproximadamente 500\ nm, logo quaisquer defeitos devem ser menores do que 25\ nm (aproximadamente 250 átomos).

Outro problema relacionado ao tamanho surge do fato da lente ser suportada pelas suas bordas (outra configuração iria bloquear a luz). Por causa disso, conforme o tamanho e massa da lente são aumentados, ocorre uma deformação no seu formato causado pelo seu próprio peso. Intuitivamente, essa deformação também depende do ângulo de inclinação do telescópio.

Outro problema surge das dificuldades relacionadas a confecção de grandes lentes, sendo um processo trabalhoso e de enormes gastos. Sem mencionar alguns problemas mecânicos e térmicos que surgem nas observações.

Considerando todas as dificuldades inerentes do design e construção dos telescópios refratores, não é surpreendente a maioria dos telescópios modernos serem refletores. O maior telescópio refrator do mundo está localizado no Observatório de Yerkes, dirigido pela University of Chicago. Ele foi construído em 1897 e possui uma objetiva de 1.02\ m (40 in) com um comprimento focal de 19.36\ m.

Tirando os grandes refratores construídos no final do século XIX, a maioria dos refratores são hoje encontrados em pequenos instrumentos para o mercado amador ou como um guia para telescópios de instrumentos maiores. O tubo fechado e a óptica firme dos refratores significa que eles precisam de poucos ajustes quando alinhados com o telescópio principal.

Telescópios Refletores

Um telescópios refletor é feito substituindo a lente objetiva por um espelho, eliminando quase todos problemas discutidos. Com um espelho, não existe o problema da aberração cromática, dado que a reflexão da luz em um determinado ponto não depende do comprimento de onda. E como o espelho é suportado por trás ao invés das laterais, é possível utilizar o método de óptica adaptativa: correção em tempo real das distorções causadas pela turbulência da atmosfera terrestre por meio do controle computacional de espelhos deformáveis.

Para fornecer um bom imageamento, a superfície do elemento refletor deve ser um paraboloide (uma parábola de revolução), e a superfície deve estar livre de quaisquer irregularidades maiores que uma fração (aproximadamente 1/20 novamente) do comprimento de onda da luz que deve ser focalizada.

O Hubble Space Telescope teve problemas iniciais no imageamento por causa da aberração esférica. Um problema no molde do espelho gerou um desvio de aproximadamente 2\ \mu m. O resultado foi uma diferença de 4\ cm entre os pontos focais da luz incidente no centro do espelho e da luz incidente em suas bordas.

 

Figura 4: Galáxia M100 tirada pela câmera WFPC1 (esquerda) e WFPC2 (direita) mostra a melhora na qualidade das imagens do Hubble após a correção da aberração esférica. Crédito: NASA

Agora vamos voltar a nossa atenção para o que acontece com a imagem formada pelo espelho primário. Substituir a lente por um espelho não afeta os fundamentos da formação de imagens. Entretanto, existe um problema causado pela reflexão da luz na mesma direção em que ela veio. Para examinar a imagem, um observador deve ser colocado entre o espelho e o objeto de interesse, bloqueando uma porção da luz incidente. Essa configuração é chamada de foco primário, e tem a vantagem de não utilizar espelhos adicionais.

Este problema foi reconhecido por Newton, que formulou um design óptico chamado de Design Newtoniano ou Foco Newtoniano. Newton simplesmente utilizou um espelho plano inclinado 45^{\circ} em relação ao plano focal do espelho primário. Como a imagem é formada no lado do tubo, equipamentos colocados no foco geram um torque significante, dificultando a utilização deste design em grandes telescópios terrestres.

 

Figura 5: O princípio de um refletor Newtoniano e do foco primário.

Uma solução alternativa seria o Design Cassegrain. Nessa configuração, o espelho secundário é um hiperboloide, fato que alonga o comprimento focal do sistema. Como a região do espelho primário é localizada atrás do secundário é inútil de qualquer forma, é possível abrir um buraco no primário, que será onde a luz refletida pelo secundário passará. Esse design torna possível colocar instrumentos pesados próximos ao centro de massa do telescópio e permite um observador ficar atrás do tubo.

 

Figura 6: O princípio de um refletor Cassegrain.

Caso os instrumentos sejam muito massivos, é geralmente mais eficaz trazer luz diretamente para uma sala especial onde o detector está localizado. O Design Coudé usa um conjunto de espelhos para refletir a luz até a sala de coudé, localizada abaixo do telescópio. Um desvantagem dessa configuração é o elevado número de espelhos que deve ser usado. Nenhum espelho é perfeitamente refletor, e um pouco da luz é perdida a cada reflexão.

 

Figura 7: O princípio do foco Coudé.